quarta-feira, março 06, 2013

Quando a música é para ver

Depois de um longo processo de estreias de telediscos online, o projeto que os Sigur Rós lançaram tendo por base as canções do seu mais recente álbum de originais Valtari chegou agora ao DVD. Este texto foi originalmente publicado na edição de 27 de fevereiro do DN com o título ‘Criar imagens para as canções dos Sigur Rós’. 
A música pode ver-se? Naturalmente sabemos da impossibilidade física de "ver" as ondas sonoras sem o auxílio de aparelhos que as captem e registem visualmente. Mas a história da música foi-nos habituando a relacionar sons com imagens. Imagens que ora podem ser criadas nos cenários em que a música se apresenta, as capas dos discos onde ela nos chega às mãos, os filmes que a tomam por banda sonora e, fruto de um exercício ainda mais abstracto e pessoal, as que geramos nas nossas próprias mentes perante os estímulos que os sons em nós despertam. Por tudo isto (e mais outras hipóteses possíveis) dizer que a música dos islandeses Sigur Rós é visual está longe de ser um tropeção contra as leis da física. É uma realidade que a sua obra em disco e filme o pode comprovar, servindo o projeto Valtari Film Experiment (que agora conhece edição em suporte de DVD entre nós) um bom exemplo de tão recorrente e bem sucedido relacionamento entre sons e imagens na história do trabalho do grupo. E basta recordarmos o teledisco de Vidrar vel til loftárása (com imagens em câmara lenta em volta de um jogo de futebol) ou o documentário Heima, de Dean DeBlouis, para reconhecermos as qualidades desta boa relação.

Há menos de um ano, com o álbum Valtari em mãos, os Sigur Rós desafiaram uma série de realizadores a criar pequenos filmes para as novas canções (podemos chamar-lhes telediscos, mas na verdade escapam à lógica mais habitual de promoção de singles). Parte significativa dos filmes foram convites a vários realizadores, concedendo-lhes total liberdade criativa. Entre eles contaram-se figuras com considerável projeção como o são os casos de John Cameron Mitchell (o autor de Hewdig e Shortbus), Floria Sigismondi (que acaba de assinar o novo teledisco de David Bowie recentememte estreado), Alma Har'el (autora do documentário Bombay Beach), Ramin Bahrani (o autor de Chop Shop) ou o fotógrafo norte-americano Ryan McGinley.

O projeto abriu depois espaço à participação de outros profissionais e, sobretudo amadores, através de um concurso que selecionou dois dos filmes que agora fazem o corpo deste projeto. Os primeiros sinais do Valtari Film Experiment surgiram a 21 de maio de 2012 com Ég Anda, canção do álbum que se apresentava na forma de um pequeno filme do islandês Ragnar Kjartansson (cuja obra de estende da música à pintura) onde, com algum humor, se definia um guia prático para ajudar pessoas engasgadas. Os 16 pequenos filmes foram surgindo regularmente, revelando olhares sobre vários cenários e situações, cruzando linguagens e géneros cinematográficos (chegando mesmo à animação), revelando a presença de atores como Shia LaBeouf, Elle Fanning ou John Hawkes, concluíndo a série a 6 de dezembro com Leaning Toward Solace, de Floria Sigismondi, que usa como banda sonora as canções Daudalogn and Varúd.