terça-feira, março 19, 2013

Mitsuko Uchida & Mozart

MITSUKO UCHIDA por RICHARD AVEDON

* FUNDAÇÃO GULBENKIAN, Grande Auditório (Segunda-feira, 18 Março 2013, 21:00)

Provavelmente, muitos dos que assistiram ao admirável concerto de Mitsuko Uchida (uma estreia portuguesa!) esperavam uma austeridade mais ou menos impenetrável. E tanto mais quanto a lendária pianista vinha não apenas interpretar dois concertos para piano e orquestra, de Mozart (programa), mas também dirigir a Mahler Chamber Orchestra. O certo é que a transparência ágil da sua pose — numa direcção em que confluem rigor e energia, precisão e entusiasmo (a ponto de reiniciar um dos andamentos, sinalizando o facto à orquestra com um exuberante batimento das mãos) — foi a marca mais imediata de um profundíssimo labor com a escrita mozartiana, de que ela é, incontestavelmente, uma das especialistas mais sofisticadas.
Foi, acima de tudo, a prova muito real de que a fidelidade a Mozart não se faz de uma atitude de banal reverência, mas sim de uma exigência face à sua música que, muito para além da versatilidade técnica, respeita todas as suas nuances estruturais e emocionais. E se dúvidas houvesse sobre a invulgar confluência de talentos a que estávamos a assistir, a orquestra ainda nos ofereceu uma primorosa interpretação de uma peça de Béla Bartók (Divertimento, Sz. 113) habitada por espantosos ziguezagues (melo)dramáticos.
No final, a sensação de naturalidade de Uchida ficou como sinal ambíguo de uma artista cuja intransigência formal integra, sem drama, a imagem serena do corpo. Em termos simples, simplesmente festivos: um dos acontecimentos marcantes do ano musical de 2013.

>>> Neste registo, com a Camerata Salzburg (Março 2001), Mitsuko Uchida interpreta  outro concerto de Mozart (K. 466) — de uma emissão do canal Mezzo.