terça-feira, fevereiro 19, 2013

Novas edições:
Nick Cave & The Bad Seeds, Push The Sky Away

Nick Cave & The Bad Seeds 
“Push The Sky Away” 
Bad Seeds Ltd. / Popstock 
5 / 5 

Podíamos questionar se será Nick Cave o Leonard Cohen ou a Patti Smith da geração que emergiu dos ensinamentos do punk e ganhou visibilidade nos anos 80. Mas fazê-lo seria talvez um exercício de comparação ingrato, a ideia do músico com verve literária (e inclusivamente obra em livro publicada) mesmo sendo denominador comum, sendo apenas uma das características que hoje distinguem Nick Cave dos demais como um dos veteranos mais ativos e mais inspirados e de horizontes mais largos que a música conhece no nosso tempo. Nos últimos anos aprofundou o seu relacionamento com os espaços do cinema (assinando argumentos e bandas sonoras) e experimentou um percurso alternativo mais próximo das raízes bluesey do rock ‘n’roll com os Grindermen (com os quais editou dois álbuns entre 2007 e 2010). Mas agora reencontra o trilho que se mantém central à sua carreira, apresentando um 15º álbum com os Bad Seeds. E que é, simplesmente, o seu melhor disco de sempre. Tranquilizem-se os espíritos desde já exaltados por esta expressão tão definitiva, que semelhante distinção não menoriza o intenso e marcante percurso que, depois dos Birthday Party, e com os mesmos Bad Seeds, protagonizou nos anos 80 (com momento maior no referencial Tender Prey, de 1988) ou numa outra obra-prima, criada num período de profundas mudanças (pessoais e artísticas) que em 1990 se materializou em The Good Son. Mas Push The Sky Away é o mais coeso, bem composto, magnificamente escrito e musicalmente desafiante dos discos de Nick Cave, o que de diferente nos mostra no fundo acabando por nada contrariar todo um percurso, que agora até podemos ver como o longo caminho para aqui chegar. A saída de Mick Harvey e a consequente entrada em cena de Warren Ellis (importante colaborador de Cave não apenas nos Grindermen, mas mais ainda no trabalho de composição para cinema), abriu caminho para uma nova paleta instrumental e sua distribuição nos cenários que envolvem as canções, a voz de Nick Cave, que mantém aqui um inalterado protagonismo formal e narrativo. As guitarras são secundarizadas, a condução dos acontecimentos revelando maior expressão do trabalho com o violino, teclas e uma construção cénica de texturas (por vezes orquestrais) que acentuam o carácter melancólico e a placidez aparente que domina um alinhamento impressionantemente consistente e coeso (como um bom álbum deve ser, com principio, meio e fim e por esta ordem). Digo aparente porque, sob a elegância de formas que cativam atenções moram histórias do lado errado da noite, da face mais sombria do amor, mantendo presentes olhares, figuras e sensações que têm cruzado o âmago da identidade de Nick Cave. Assim se desenham, com canções sublime como o são Jubilee Street, Wide Lovely Eyes ou o cartão de visita que há algumas semanas nos foi dado a conhecer ao som de We No Who U R, os caminhos de álbum que, no seu corpo, não exclui heranças naturais de um Nick Cave mais anguloso no canto (Water’s Edge), um antigo interesse pelas raízes dos blues (Higgs Bosom Blues) ou até mesmo uma reflexão sobre o rock’n’roll, reconhecendo que é alma que o habita, e que vai continuar a desbravar, a desafiar, como nos confessa o tema-título, que encerra o alinhamento.