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Jerry Lewis, 1961 |
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Jean-Luc Godard, 1973 |
O nosso orgulho continental tende a descrever as convulsões cinematográficas do começo dos anos 60 como um affaire europeu, liderado pelos mosqueteiros da "Nouvelle Vague"... Hélas! Nada é tão simples. Desde logo porque, em Nova Iorque, sob a égide de John Cassavetes, a experimentação era temática e formalmente riquíssima, conferindo especial importância ao lugar do actor. Depois porque Hollywood se tinha transformado num fascinante caldeirão de contradições, (des)organizado a partir da colisão dos mestres clássicos com os novos cineastas emergentes.
Um dos novos, por certo dos mais revolucionários, chamava-se Jerry Lewis (n. 1926). Depois de um período exuberante, em dupla com Dean Martin, começara a realizar os seus próprios filmes em 1960, sob a égide da Paramount, com The Bellboy/Jerry no Grande Hotel.
A sua segunda longa-metragem é, muito simplesmente, uma das obras-primas de toda a história da comédia: The Ladies Man/O Homem das Mullheres serve de enciclopédia do imaginário lewisiano — o medo face ao mistério feminino, a inadequação aos objectos do quotidiano, a infinita transfiguração do actor, etc. —, tendo funcionado como admirável espaço de experimentação. Assim, o cenário da casa, em corte transversal, é uma fabulosa reconversão "teatral" do espaço fílmico, retomada por Jean-Luc Godard, em 1973, nesse genial filme (anti)político que é Tudo Vai Bem [ver fotogramas em cima]. Além do mais, pela primeira vez, Lewis acoplou à sua câmara de 35 mm uma pequena câmara de video, de modo a poder ver de imediato, num televisor, o que estava a filmar — dessa experiência pioneira nasceu o sistema de registo das imagens filmadas para visionamento imediato (video assist), hoje em dia vulgar na maioria das rodagens cinematográficas.
No final, Lewis dava-se ao luxo de perverter o próprio logotipo da Paramount, dispensando o clássico "The End", optando antes pela palavra "Over"... enfim, mais ou menos.