terça-feira, julho 17, 2012

"Mad Men": o fascínio televisivo

Que seria da televisão sem Mad Men? Que seria da televisão portuguesa sem Mad Men? Pois bem, a boa notícia é que a série de Matthew Weiner está de volta, servindo implicitamente como modelo crítico dos lugares-comuns narrativos e morais (= telenovela e seus derivados) que enxameiam o espaço televisivo — este texto foi publicado no Diário de Notícias (13 Julho), com o título '"Mad Men" contra as telenovelas'.

Há qualquer coisa de tematicamente pueril e esteticamente obsceno no modo como os autores de telenovelas caracterizam o seu trabalho em função de admiráveis valores narrativos. Porque estariam a fazer “sociologia” dos nossos tempos... Porque desmontariam os “dramas” da psique humana... Porque ousariam desafiar os “tabus” do presente...
De facto, limitam-se a gerir um sistema de lugares-comuns psicológicos, morais e sexuais que aprisionam personagens e situações em espartilhos narrativos que destroem tudo e todos. Desde os cenários de hiper-mercado iluminados com luz de telejornal até aos actores cujo talento (muito ou pouco) não tem condições para se exprimir.
Vale a pena recusar a demagogia corrente que define a telenovela como uma espécie de destino televisivo, obrigatório e incontornável. Na verdade, o panorama global da televisão contemporânea desmente semelhante asserção, mostrando que as alternativas existem e dependem, muito simplesmente, de opções que se tomam (ou não tomam).
Mad Men, por exemplo: chegou a quinta temporada da prodigiosa série criada por Matthew Weiner (RTP2, quarta-feira) e o menos que se pode dizer é que estamos perante um dos mais subtis retratos que já se fizeram sobre os anos 60, o seu imaginário e respectivos ecos simbólicos. Haverá, por certo, outras oportunidades para analisarmos a fascinante riqueza de Mad Men. Sublinhemos, para já, a sua demarcação em relação às convenções das telenovelas.
Os cenários, por exemplo: não se trata de usar mobílias da época apenas para fazer kitsch, mas sim de mostrar como existimos sempre em função (e através) dos espaços que habitamos. Também as relações humanas: não se desenvolvem através de truques baixos de “ilusionismo” dramático, celebrando antes a infinita complexidade afectiva de cada personagem. O sexo, enfim: nas telenovelas, acredita-se (ou tenta fazer-se acreditar) que acontece alguma coisa de interessante só porque alguém aparece mais ou menos despido; vejam Mad Men e reparem como, muitas vezes, a mais violenta perturbação erótica pode acontecer com personagens pudicamente vestidas...