quarta-feira, maio 09, 2012

O ritmo do tempo


Estamos no campo, a uns trinta e tal quilómetros, de Keskin, no centro da Anatólia, em plena Turquia rural. Era uma vez... Tudo acontece entre uma noite e uma manhã. E tal como longas são as horas da noite, também o tempo aqui se faz ver e escutar, o olhar de quem está na plateia acompanhando por vezes muitas das sequências como se vividas em tempo real, os passos, as esperas, o som do vento, as conversas que surgem para ocupar os minutos acabando refletidas na própria forma do realizador entender o filme que nos quer mostrar.

Em Era Uma Vez na Anatólia (o título evoca o de dois clássicos de Sergio Leone, Era uma Vez no Oeste e Era Uma Vez na América, respetivamente de 1968 e 1984), de Nuri Bilge Ceylan, a procura do corpo de um homem que se crê ter sido assassinado leva uma pequena caravana a percorrer estradas entre a estepe numa noite onde só as luzes dos faróis e as conversas entre quem ali segue rompem o silêncio. A busca, que acompanhamos vivendo as esperas e dúvidas como aqueles que ali estão serve contudo não apenas para a reconstituição do que eventualmente terá acontecido mas, sobretudo, para promover um olhar sobre uma cultura, modos de vida, comportamentos, os pequenos nadas somando as peças que fazem um retrato que vamos construindo sem pressa (é por isso inesquecível toda a sequência vivida a meio da noite quando visitam uma casa no meio de nada para tomar um chá e descansar por uns momentos). Acrescente-se que o realizador nasceu e cresceu numa região semelhante, o filme acabando por expressar assim ecos de uma vivência que bem conhece.

A vastidão dos espaços e a extensão dos minutos que passam moram na medula de um filme que não deixa contudo de tomar o seu fio narrativo como coluna vertebral, as sequências finais, de regresso à cidade (com outras noção de ritmo), colocando as peças finais numa história que reflete ainda sobre como a verdade sem sempre é revelada como tudo de facto se passou...



Imagens do trailer do filme