domingo, abril 15, 2012

John Adams de regresso a San Francisco

Gravação magnífica de duas obras de John Adams compostas nos anos 80 pela San Francisco Symphony, para a qual foi o primeiro compositor residente, entre 1982 e 1985. A direção é de Michael Tislon Thomas e a edição pela SFS Media, a editora da própria orquestra.

A história começa há pouco mais de 30 anos quando, em 1979, um ainda jovem John Adams (n. 1947) se junta profissionalmente à San Francisco Symphony como, inicialmente, consultor, um pouco depois tomando o lugar de primeiro compositor residente da orquestra (cargo que ocupou de 1982 a 1985). E através da orquestra de San Francisco (Califórnnia) o compositor estreia obras fulcrais numa etapa de afirmação da sua própria afirmação enquanto voz criativa como Grand Pianola Music, Harmonium ou a absolutamente assombrosa Harmonielehre, uma “sinfonia” (se bem que não se apresente sob essa designação) que representaria (mais que os anteriores Shaker Loops ou Harmonium), dois anos antes da histórica ópera Nixon In China (1987), como o grande “cartão de visita” que definitivamente o deu a conhecer ao mundo. Foi a San Francisco Symphony quem levou então a boa nova para lá da sua sala de concertos, numa gravação dirigida por Edo de Waart que teve então edição no catálogo da Nonesuch Records. Agora, quase trinta anos depois, a mesma orquestra, porém sob a batuta de Michael Tilson Thomas, volta a gravar esta obra maior da música americana de finais dos anos 80 gerando aquele que é desde já um dos títulos “obrigatórios” de 2012.

Numa primeira abordagem o título de Harmoninelehre pode evocar Arnold Schoenberg (e em concreto um texto teórico marcante), figura que John Adams admirou intensamente numa etapa de formação, mesmo que a sua música não tenha depois seguido as regras que o compositor austríaco inscreveu na história da música do século XX. Na verdade, através de Harmonielehre cruzam-se os dois universos centrais que conduziram John Adams à descoberta da sua identidade autoral. Por um lado a grande tradição ocidental europeia (Mahler, Sibelius, Debussy...), que decorre de uma educação que teve na música clássica um importante pilar estrutural. Por outro, os ecos mais próximos do minimalismo norte-americano (bem visíveis na sua música dos anos 80), fruto de uma atenção para com estes compositores que, tal como os mundos do jazz e da música rock fizeram parte do seu espaço de audições desde sempre. Harmonielehre é pois uma sinfonia do seu tempo por um homem do seu tempo. Sugere tensão na abertura, fragmentando depois as ideias numa série de pequenos acontecimentos que nos conduzem a um andamento lento que transporta ecos da etapa final do romantismo, antes de um pulsante crescendo final nos conduzir a um desfecho empolgante.

Como complemento, o disco junta uma gravação da curta peça Short Ride in a Fast Machine, de 1986. Ambas apresentam-se em gravações ao vivo no Davies Symphony Hall, a primeira em dezembro de 2010, a segunda em setembro de 2011. A orquestra respira esta como sendo uma música que faz parte do seu corpo, a direção de Tislon Thomas compreendendo o jogo de contrastes entre o tom meditativo das passagens lentas, conduzindo depois de forma exultante o pulsar rítmico que brota da sua estrutura. O disco sublinha assim a vitalidade de uma ligação que continua a unir o compositor à orquestra que em primeira mão deu corpo a esta música. Ligação que se mantém viva também no plano profissional uma vez que, há poucos dias, a San Francisco Symphony fez a estreia mundial de Absolut Jest, a mais recente obra de John Adams.


Imagens  de um vídeo onde maestro e compositor falam de Harmonielehre.