1. Em Portugal (e não só), muitos jornalistas promovem a ilusão de que o espaço jornalístico é uma paisagem apaziguada, habitada por seres que partilham uma linguagem universal. Uns fá-lo-ão por pura e perigosa ignorância, porventura auto-justificada por uma militante inocência. Outros não passam de peões de um ecumenismo demagógico cujo cinismo continua a degradar a profissão.
2. Veja-se o caso desta notícia (no site Portugal MSN). Em boa verdade, escrever que [George] "Clooney foi preso" é uma generalidade que exclui o essencial. A saber: a contextualização da notícia (a foto também não pertence à situação noticiada). É verdade que fazendo um click, vamos parar a uma zona em que uma série de fotografias é apresentada com breves legendas, mais ou menos esclarecedoras, pelo menos do facto de o actor ter sido preso durante uma manifestação, em Washington, às portas da embaixada do Sudão, chamando a atenção para o drama humanitário que se vive nesse país — o título, ainda assim, persiste em favorecer a abstracção: 'George Clooney preso por uma causa'.
3. Na prática, todos estes detalhes decorrem de um entendimento mediático das notícias em que os factores de destaque estão previamente decididos e formatados, independentemente dos factos que são objecto da notícia. Diferenças? Muitas. Um contra-exemplo esclarecedor poderá ser a notícia sobre a mesma ocorrência publicada pelo New York Times. Para além do rigor do texto, convenhamos que há uma diferença (de tom, de estilo e de ideologia jornalística) entre o pueril "Clooney foi preso" e este título: "Clooney entre manifestantes presos na Embaixada do Sudão em Washington" — veja as diferenças.