quarta-feira, janeiro 04, 2012

Em conversa: Os Capitães da Areia (1)


Lançaram o seu álbum de estreia na reta final de 2011, revelando uma ideia pop luminosa e com sabor a Verão. Esta é a primeira parte de uma entrevista aos Capitães da Areia que serviu de base ao artigo 'Música pop para contagiar o lado luminoso da vida' publicada na edição de 28 de dezembro do DN.

Muita da música portuguesa é essencialmente melancólica (mas não toda, é certo). Somos um país de gente triste?
A feira popular regressou a Lisboa e as cassetes de música pimba continuam a vender. Não sabemos se somos um país de gente triste mas nós acordamos bem dispostos e mastigamos de boca fechada enquanto tomamos o pequeno-almoço. Primeiro nascemos, depois veio a infância e a adolescência. Hoje em dia, a vida dá-nos cada vez mais vontade de cá estar. Gostamos de fazer partidas e já tentámos descobrir onde acaba o arco-íris. O que nos move é o lado luminoso da vida. Agora resta-nos contagiar.

O que vos levou a fazer uma música que contraria essa ideia e que é, claramente, luminosa e otimista? 
Nós queremos luz, queremos flores, frutos silvestres a escorrer sumo pelas nossas faces, queremos sol e no altar a alegria. É isto; e vamos estar sempre a repetir como um conta-gotas imparável – inspirados na tortura chinesa. É uma necessidade para Os Capitães da Areia a vivência de uma juventude saudável e simultaneamente desvendar como um país que herda um dádiva como o Fado consegue viver também, respeitando as suas origens e ascendentes, a vida com esperança. A música portuguesa é melancólica? Então está na hora de passear descontraidamente em sentido contrário. É nosso dever fazer sobressair o lado excêntrico dos cantares e o tropical do Fado. Por sua vez, já que fazem questão de nos vir dizer a todo o instante que Portugal está carente, então nós temos umas canções com uma dose muito muito leve de tristeza, biscoitos e chá-chá-chá.

A música de Verão pode ouvir-se de Inverno? 
Quem costuma usar auscultadores com gorros por cima ou aquelas protecções para não apanhar frio nas orelhas, talvez não consiga ouvir música de Verão. E aí a intenção está errada porque não queremos contribuir para proteger do frio. Queremos que se dispam de preconceitos e abracem a estação imaginária. Está frio? Não se agasalhem mais e mais. É a dançar que “a gente se entende”, como o bom português diria. Inverno solarengo não pode ser molengão.

O Verão é mesmo eterno? Ou o título do álbum traduz antes o desejo de que assim fosse? 
Assente na estação imaginária, o disco denomina-se O Verão Eterno d'Os Capitães da Areia, inequivocamente, porque a nossa maneira de o ver é precisamente essa. Queremos espalhá-la e cantá-la a quem a queira ouvir. Faça chuva ou haja relâmpagos a rasgar o céu.

Deram tempo a vós mesmos para tactear terreno antes de pensarem em discos. Sentiram que puderam assim desenvolver as ideias sem datas impostas por outros? 
Foi essencial não termos a pressão de datas impostas para podermos preparar da melhor maneira as canções para este disco e a forma como se ligam entre sonoridades e arranjos diferentes. Durante dois anos conhecemo-nos, tornámo-nos grandes amigos e começámos a olhar na mesma direção. Assim que sentimos que estávamos prontos para inaugurar esta aventura musical, instalámo-nos numa autocaravana na Coutada Velha e demos início às gravações. O resultado é um disco e não apenas canções dispersas. Há todo um encadeamento lógico de som e letras. Queremos que as pessoas o oiçam do princípio ao fim e que mergulhem no Verão Eterno d'Os Capitães da Areia.

PS. A entrevista surgiu originalmente no "velho" acordo ortográfico, mas agora publicamo-la no "novo".

(continua)