A imagem é esplendorosamente quente. Primeiro porque nos dá a ver um ditador (e esposa) em estado de diversão — questão sempre perturbante: onde está o prazer de um ditador? Depois, porque exibe a passagem do tempo, com as cores já algo degradadas e os riscos da película (nuance: eis um ditador pré-digital). Enfim, porque se trata de uma imagem de propaganda do regime de Nicolae Ceausescu que se expõe na sua apocalíptica contradição: a exaltação do líder perde-se no labirinto das significações, permitindo-nos ver também a cegueira do poder absoluto e a irrisão religiosa da ideologia comunista. Não é todos os dias que um filme possui esta tão admirável consciência da pluralidade significante das imagens: A Autobiografia de Nicolae Ceausescu, de Andrei Ujica, convoca-nos para a arte esquecida de olhar o mundo à nossa volta, sem esquecer as imagens que foram feitas contra nós.