Mês Clássicos Disney - 19
Este mês pedimos a uma série de amigos que nos falassem do “seu” filme da Disney. Hoje recordamos Rato Basílio - O Grande Mestre dos Detectives, longa-metragem de 1986 que aqui é evocada por João Lameira, autor do tumblr Numa Paragem do 28. Um muito obrigado ao João pela colaboração.
Os anos 80 não foram particularmente felizes para a maior produtora mundial de desenhos animados, Walt Disney morrera há uns vinte anos (e com ele a aura de infalibilidade) e o ressurgimento dos anos 90 ainda parecia impossível. A minha geração teve azar. Mas para uma criança isso pouco interessava — à época vi muitos dos clássicos da Disney, que se faziam rogados e só apareciam de vez em quando; mesmo uma reposição como a de O Robin dos Bosques (para o qual arrastei toda a família comigo, por turnos, e vi quatro ou cinco vezes; quando era miúdo, se gostava muito de um filme, tinha de repetir a dose) era um acontecimento (o que numa altura em que tudo está sempre disponível como agora, já não cabe na cabeça de ninguém, quase nem na minha).
Ainda assim, lembro com ternura este O Rato Basílio, estreado em 1986 ou 1987, tinha eu seis ou sete anos; fui vê-lo ao Tivoli, tenho quase a certeza disto, numa festa, de Natal talvez, da empresa do meu pai (que, coitado, tinha de aturar todos estes filmes de desenhos animados, aproveitando para pôr o sono em dia, sendo que às vezes eu tinha de lhe dar umas cotoveladas para ele parar de ressonar). O dito Basílio é um Sherlock Holmes em forma de rato, que também toca violino e fuma cachimbo (que politicamente incorrecto) e resolve mistérios; vive na mesma casa e tudo. Aliás, todas as personagens do filme são ratos — eu, a quem os ratos verdadeiros repugnam, especialmente quando me entram casa adentro, adorava-os a todos, à excepção do mauzão Rattigan, uma grande ratazana (e não gostava que lho lembrassem, compreensivelmente), de que tinha imenso medo, assim como daquela gata enorme com um lacinho no cocuruto (a Disney sempre soube meter medo às criancinhas, felizmente).
Outra coisa que nunca me saiu da cabeça (acho que era por ter o livro do filme que me lembro tão bem de todas as imagens) foi aquela boneca mecânica que faz rima com aquela outra de O Ladrão de Bagdad, que não pertence a este texto, mas que ilumina a aproximação de O Rato Basílio a filmes de outras eras e de outros géneros. Por exemplo, deve ter sido o meu primeiro contacto com a Inglaterra Vitoriana, em que haveria de aparecer, depois, por entre nevoeiro e fumo das fábricas, a terrível figura de Jack, o Estripador. Rattigan, o referido mau da fita, não era como esse assassino de prostitutas, embora a voz fosse emprestada por Vincent Price, lenda do Terror. Se bem que na minha imaginação o dito chamar-se-á sempre Ratagão e falará em português do Brasil (li algures que o actor que lhe deu essa voz, André Filho, já morreu). Mais um paradoxo: para mim, que detesto dobragens, ainda mais brasileiras, todos esses filmes da minha infância são na nossa língua com o sotaque do outro lado do Atlântico. Foi uma pena que não tenha encontrado essa versão, quando revi agora o filme.