GIORGIO DE CHIRICO Canção de Amor, 1914 |
"Os estados sempre tiveram dívidas e essas dívidas vão continuar no futuro. O que é importante (...) é que os estados tenham essas dívidas geridas por forma a oferecer confiança a quem decide investir o seu dinheiro nas dívidas públicas de todo o mundo."
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Ditas pela maioria dos actores da cena política, estas palavras não passariam de assunto de rotina — uma espécie de linha geral de pensamento a partir da qual se torna possível pensar as opções políticas, necessariamente diversas e contraditórias, para lidar com a actual conjuntura económica.
Mas acontece que estamos num país chamado Portugal.
E que quem as proferiu foi um cidadão de nome José Sócrates.
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O sentido mediático de muitos sectores da classe política, de tão desastroso, tem algo de comovente. Tivemos hoje um curiosíssimo exemplo de tal sentido com a delirante visibilidade das palavras de José Sócrates, de imediato sustentada por múltiplas e infinitas "análises", a ponto de o próprio ter surgido na RTP para esclarecer o sentido da suas declarações. Na prática, os inimigos políticos de Sócrates conseguiram a proeza de lhe oferecer, numa bandeja, o tão especulado regresso que esses mesmos inimigos prenunciavam ou temiam (a nossa miséria intelectual tem mostrado mesmo que é chique fazer chacota com o facto de alguém estar a "estudar em Paris").
Para mais, na sua apoteótica candura, tais inimigos cederam ao seu fantasmático alvo um trunfo que, por certo, nem o próprio Sócrates esperaria, sobretudo entregue de modo tão ingénuo e transparente: a do lugar (televisivo) do simples cidadão que exerce o direito básico de recusar a manipulação abusiva do seu discurso.
Passos Coelho, hélas!, foi dos poucos a ter a inteligência de reconhecer a pertinência das palavras de Sócrates. Para além disso, ficamos a saber que vastos sectores da classe política (e também dos meios de comunicação) quase não conseguem lidar com o peso específico das ideias políticas, a não ser através de alguma alusão a José Sócrates — é um assombramento tão interessante quanto preocupante.
Para mais, na sua apoteótica candura, tais inimigos cederam ao seu fantasmático alvo um trunfo que, por certo, nem o próprio Sócrates esperaria, sobretudo entregue de modo tão ingénuo e transparente: a do lugar (televisivo) do simples cidadão que exerce o direito básico de recusar a manipulação abusiva do seu discurso.
Passos Coelho, hélas!, foi dos poucos a ter a inteligência de reconhecer a pertinência das palavras de Sócrates. Para além disso, ficamos a saber que vastos sectores da classe política (e também dos meios de comunicação) quase não conseguem lidar com o peso específico das ideias políticas, a não ser através de alguma alusão a José Sócrates — é um assombramento tão interessante quanto preocupante.