segunda-feira, agosto 08, 2011
A alvorada chega hoje à Suíça
Onde moram, os limites do realismo? Ou, por outras palavras, como pode um olhar sobre o real deixar claras as marcas de quem o assina? Alvorada Vermelha, o documentário de João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata que hoje passa em Locarno não nasceu para ser solução a estas questões. Mas de certa forma é capaz de lhes dar resposta.
O filme acompanha o início de mais um dia de trabalho no Mercado Vermelho, em Macau. Olha as portas ainda fechadas, o vai e vem de carregadores que levam as grandes peças para os talhos ou os cestos de peixes às peixarias, dando depois lugar a uma verdadeira matança, aves e peixes sendo preparados para ser expostos e vendidos. Os gestos são mecânicos, repetitivos, rápidos, a montagem sublinhando a intensidade dos olhares, vincando também o ritmo intenso com que tudo acontece... No entanto, entre imagens de crua realidade, breves (e discretas) marcas de uma certa fantasia cortam o clima, do sapato de salto alto que vemos em plena rua antes do sol raiar às sereias que, a instantes, quase parecem morar nos tanques de peixe.
Quase sem palavras, mas de argumento sólido e firme num quadro de intenções (éticas e estéticas) que regista no ecrã, Alvorada Vermelha é mais um brilhante momento de cinema assinado por João Pedro Rodrigues, aprofunda o seu trabalho em colaboração com João Rui Guerra da Mata e mostra que para ver o espaço ao nosso redor se exige um olhar que sabe o que vê (e como vê).