quarta-feira, junho 08, 2011
Entre o cinema e a televisão
Apesar das diferenças de linguagem e códigos entre os dois meios, há por vezes uma ténue noção de fronteira entre o que é cinema e o que é televisão. Angels In America, de Mike Nichols, por exemplo, nasceu para a televisão... Mas é mais cinema que muitos filmes que temos visto por aí. Nos últimos temos assistido a uma curiosa noção de vida dupla de séries que também são filmes (ou vice versa). Como o foi o caso dos Mistérios de Lisboa, de Raoul Ruiz. Ou este Carlos, de Olivier Assayas.
Um olhar sobre 20 anos na vida de um dos mais célebres terroristas do século XX – Carlos, o Chacal – o filme de Assayas pode assentar segundo uma lógica arrumada que não só ordena cronologicamente os factos como tem o cuidado de apontar, a cada figura que entra em cena, quem é e o que representa nesta história. Cuidados que poderiam sugerir coisa nas esferas do documentarismo. Mas que, logo à partida, uma advertência deixa claro que nada disso se trata, o espaço para a ficção existindo bem claro no corpo da narrativa.
Além de um excepcional trabalho do actor protagonista (venezuelano como o próprio personagem que interpreta), fazendo Assayas questão de olhar para as transformações do seu corpo como forma de sublinhar não apenas a passagem do tempo mas como a própria vida o foi tratando, o filme observa ainda a forma como certos grupos que funcionam à margem da ordem ora se relacionam, ora deixam de relacionar com os poderes oficiais, consoante as marés que fazem a sua agenda.