No programa Câmara Clara, foi tema os "Dias da Música" no CCB. Ou como escutar é descobrir a pluralidade das músicas – este texto foi publicado no Diário de Notícias (15 Abril).
António Mega Ferreira celebra George Gershwin e a presença das suas obras no Centro Cultural de Belém (“Dias da música”: 15, 16 e 17 Abril). Fala da pluralidade das composições de Gershwin, dessa gloriosa arte da contaminação que as faz pertencer ao domínio da chamada música erudita, integrando nuances, cores e ritmos eminentemente populares. Mais do que isso: Gershwin ressurge como o criador transversal, por excelência, combinando sem preconceitos referências americanas e europeias. Acontece no Câmara Clara, de Paula Moura Pinheiro (RTP2), enaltecendo coisas tão esquecidas como a fruição da música para além (ou aquém) de qualquer catalogação rígida de tendências ou modelos de consumo.
Subitamente... temos a sensação de mudar, não apenas de país, mas de galáxia. Como se, por uma frágil hora, nos lembrássemos que é possível ocupar a televisão sem sermos forçados a assistir ao espectáculo penoso de políticos especializados nas torpitudes da insinuação, comentadores “neutros” até ao vómito, ou ainda treinadores de futebol que utilizam a palavra “trabalho” mais vezes que um líder sindical.
O diálogo com Mega Ferreira e os outros convidados possui ainda o mérito de transcender a importância do próprio evento a que se refere. Sem demagogia nem malabarismos argumentativos, fica a noção simples, mas luminosa, de que, pelo menos nos últimos vinte anos, há uma evolução muito positiva das práticas musicais em Portugal, desde a formação até ao consumo. Celebrar Gershwin não é, por isso, falar de um lugar imaginário: é tão só habitar um país que não se revê na miséria televisiva das representações da política ou do futebol.
>>> Centro Cultural de Belém: "Dias da Música".