quinta-feira, março 17, 2011

Do palco para o ecrã


Cinema por quer vê (e gosta de) cinema... É a ideia central que podemos tirar depois de ver Potiche (que entre nós estreia sob o título Minha Rica Mulherzinha). Autor de uma obra que tão bem caminha ora entre a luminosidade sorridente e bem cantada de um 8 Mulheres ou a profunda dor que cruza a alma de O Tempo Que Resta, François Ozon tem sabido dispersar esses mesmos tons e estados de alma ao longo da sua filmografia, não caindo nunca na “armadilha” de fases que o pudessem limitar a caminhos menos livres. E assim, menos de um ano depois de vermos o não menos magnífico O Refúgio, eis que volta com algo completamente diferente.

Nascido em lugar de um filme político que chegou a ser ponderado, com as últimas presidenciais francesas como ponto de partida, Potiche é na verdade uma adaptação ao grande ecrã de uma peça de teatro. Não é a primeira vez qus Ozon o faz, um dos seus filmes de referencia tendo inclusivamente nascido de uma peça de Fassbinder em Gouttes d'eau sur pierres brûlantes. Aqui toma como ponto de partida uma comédia de boulevard dos oitentas, assinada por Pierre Barillet, que vira em tempos idos, à qual juntou alguma condimentação de sua lavra, fazendo afinal de Potiche um filme que não deixa de ser político...


A narrativa assenta sobre a história da vida de uma família proprietária de uma fábrica de chapéus de chuva, de uma sucessão de cenas de lutas de classes (com sequestro ocasional do patrão) nascendo uma nova ordem. Suzanne Pujol (Catherine Deneuve), vê-se forçada a abandonar a sua rotina meramente decorativa para assumir a condução dos rumos da fábrica, da sua gestão surgindo um novo entendimento com os funcionários, das suas ideias e visões brotando mesmo uma etapa de prosperidade. Ozon não deixa contudo que a história termine quando Suzanne perde a direcção da fábrica de volta para o marido. Coloca a personagem em rota de confronto com um político local (Gerard Depardieu), com quem tivera um “caso” em tempos idos, candidatando-se como independente às eleições seguintes...

Com ecos do cinema de Demy e dos filmes de Louis de Funès (que inspiraram, concretamente, a figura do patriarca Pujol), conciliando um certo tom de encenação teatral (por oposição a um mais cru realismo) com uma dinâmica narrativa e visual para o grande ecrã, usando o humor ao serviço dos conflitos políticos e sociais que retrata, e com uma banda sonora de travo disco que sublinha a acção lançada em finais dos setentas, Ozon assina em Potiche mais um belo momento de cinema.



Imagens do trailer do filme.