domingo, dezembro 05, 2010

Prémios do Cinema Europeu... nas televisões?


Confirmando uma tradição profundamente negativa, os Prémios do Cinema Europeu aconteceram quase clandestinamente, sem que a maioria dos meios de comunicação se esforçasse, ao menos, por referir a sua importância simbólica. Daí que, mais do que nunca, se justifique uma reflexão sobre o papel que esses meios, em geral, e as televisões, em particular, têm — ou poderiam ter — numa dinâmica verdadeiramente europeia da produção cinematográfica — este texto tem por base uma crónica de televisão publicada no Diário de Notícias (3 de Dezembro), com o título 'Cinema sem audiência'.

Os Prémios do Cinema Europeu ocorreram no sábado (4 Nov.) na capital da Estónia, Tallinn. Foi a 23ª edição dos chamados “Oscars” do cinema europeu. Cumprindo uma funesta tradição, temos sabido muito pouco da sua realização através das televisões. Aliás, esse silêncio devorador contamina quase toda a imprensa, em claro contraste com a cobertura dos Oscars de Hollywood (a três meses de distância da respectiva cerimónia).
Uma vez mais, são irrelevantes os discursos militantes em defesa da “identidade” do cinema europeu (como são patéticos os que tentam minimizar a riqueza artística de Hollywood). O que está em jogo é, precisamente, o débil poder mediático dessa “identidade” e a indiferença quase global das televisões às suas peculiaridades culturais e económicas — sem esquecer que qualquer cultura se articula sempre com opções de natureza económica.
Sabemos que não acontece assim em todo o continente europeu. Para nos ficarmos pelos exemplos mais óbvios, citemos o ancestral envolvimento da BBC com a indústria cinematográfica, ou ainda o modo como, desde os tempos do ministro Jack Lang, a França foi construindo uma rede de produção que tende a implicar todos os canais de televisão — com inevitável destaque para o Arte, projecto franco-alemão que tem a relação com o cinema como um dos seus pilares conceptuais e financeiros.
Para além de opções de fundo que nunca foram tomadas — e que são, inevitavelmente, de natureza política —, o drama desta situação passa, como é óbvio, pela informação. Assim, o noticiário cinematográfico, além de escasso, tende a favorecer o anedótico e o pitoresco. Sem surpresa, convenhamos: tendo sido o cinema empurrado, na maior parte dos casos, para horários noctívagos, o seu esvaziamento jornalístico limita-se a ecoar os valores dominantes das programações.
Claro que há sempre esse discurso demagógico que nos garante que o “público” prefere ver telenovelas... Certamente. Em todo o caso, fica uma sugestão construtiva: que se programem filmes às nove da noite e novelas às duas da madrugada antes de voltarmos a discutir a “verdade” das audiências.