Dos jogadores aos dirigentes, passando por muitos comentadores, o futebol televisivo transformou-se num palco de muitos clichés mais ou menos moralistas — este texto foi publicado no Diário de Notícias (16 de Abril), com o título 'Futebol com "dignidade"'.
No imaginário televisivo do futebol, já não basta que haja resultados “justos” e “injustos”. Tornou-se difícil que um golo aconteça sem que se procure algum “culpado”. Além do mais, por regra, as equipas “pequenas” nunca jogam bem: como lembrava esta semana o treinador Carlos Brito (Rio Ave), em tom de compreensível desencanto, quase sempre se explica tudo porque os “grandes” jogaram mal.
Em tão pobre conjuntura argumentativa, emerge a questão da “dignidade”. Quando se fala de “dignidade”? Para avaliar os maus exemplos de comportamento de alguns jogadores dentro do campo? Para desmontar a demagogia dos treinadores que, face a uma derrota, lançam insinuações contra os árbitros? Nada disso. A “dignidade” é um valor que só emerge... quando se perde. Já ouvimos tal discurso na boca de jogadores, treinadores e presidentes de clubes (grandes e pequenos). Não admira que o tenhamos ouvido de novo a propósito da derrota do Benfica com o Liverpool [4-1, jogo da Liga Europa] : para Luís Filipe Vieira, a equipa perdeu, mas com “dignidade”!
Infelizmente, a futebolização das televisões não favorece alguma pedagogia que se demarque deste tipo de visão e dos valores que inculca nos espectadores mais jovens. Qual é o subtexto de tal discurso? Pois bem, que há algo de moralmente suspeito no facto de se perder um jogo... Nem sequer se supõe que o adversário possa ter qualidades (neste caso, só mesmo por distracção ou delirante clubismo se acreditaria que o Liverpool, mesmo em crise, é uma equipa banal). A “dignidade” constitui uma espécie de recurso moral que vem expurgar a derrota.
Todos os dias, o futebol televisivo injecta estes valores no tecido mediático e social. E é extraordinário que um discurso crítico (sobre cinema, música ou literatura) possa ser insultado apenas por não corresponder às visões mais ortodoxas, ao mesmo tempo que este entendimento moralista do desporto constitui uma língua “oficial” que quase ninguém questiona. É mais fácil, de vez em quando, fazer debates sobre as imagens de “sexo & violência” que podem corromper as nossas desamparadas crianças...
No imaginário televisivo do futebol, já não basta que haja resultados “justos” e “injustos”. Tornou-se difícil que um golo aconteça sem que se procure algum “culpado”. Além do mais, por regra, as equipas “pequenas” nunca jogam bem: como lembrava esta semana o treinador Carlos Brito (Rio Ave), em tom de compreensível desencanto, quase sempre se explica tudo porque os “grandes” jogaram mal.
Em tão pobre conjuntura argumentativa, emerge a questão da “dignidade”. Quando se fala de “dignidade”? Para avaliar os maus exemplos de comportamento de alguns jogadores dentro do campo? Para desmontar a demagogia dos treinadores que, face a uma derrota, lançam insinuações contra os árbitros? Nada disso. A “dignidade” é um valor que só emerge... quando se perde. Já ouvimos tal discurso na boca de jogadores, treinadores e presidentes de clubes (grandes e pequenos). Não admira que o tenhamos ouvido de novo a propósito da derrota do Benfica com o Liverpool [4-1, jogo da Liga Europa] : para Luís Filipe Vieira, a equipa perdeu, mas com “dignidade”!
Infelizmente, a futebolização das televisões não favorece alguma pedagogia que se demarque deste tipo de visão e dos valores que inculca nos espectadores mais jovens. Qual é o subtexto de tal discurso? Pois bem, que há algo de moralmente suspeito no facto de se perder um jogo... Nem sequer se supõe que o adversário possa ter qualidades (neste caso, só mesmo por distracção ou delirante clubismo se acreditaria que o Liverpool, mesmo em crise, é uma equipa banal). A “dignidade” constitui uma espécie de recurso moral que vem expurgar a derrota.
Todos os dias, o futebol televisivo injecta estes valores no tecido mediático e social. E é extraordinário que um discurso crítico (sobre cinema, música ou literatura) possa ser insultado apenas por não corresponder às visões mais ortodoxas, ao mesmo tempo que este entendimento moralista do desporto constitui uma língua “oficial” que quase ninguém questiona. É mais fácil, de vez em quando, fazer debates sobre as imagens de “sexo & violência” que podem corromper as nossas desamparadas crianças...