A. O que caracteriza a nova ordem política — impossível de pensar apenas a partir das matrizes tradicionais da democracia — é o seu permanente e visceral envolvimento com o espaço jornalístico.
B. Em grande parte por indução de valores com raízes televisivas, o jornalismo em geral — o "bom" e o "mau", o sério e o oportunista — passou a viver na dependência de uma agenda de sobressaltos: muito para além da consideração moral da "verdade/mentira", o valor de uma acção jornalística tende a ser reduzido ao seu efeito de choque na dinâmica social, em geral, e na cena política, em particular.
C. O que está a acontecer com José Sócrates decorre de um processo desse género. Mas seria pueril — antes do mais da parte do Partido Socialista — considerar que o problema reside na eventual condição de "alvo" do primeiro-ministro. Em boa verdade, outras figuras de outras cores politico-partidárias, já foram sujeitas a semelhantes avalanchas. Quase sempre, o mais atingido tem sido o espaço político e, directa ou indirectamente, a governação do país. O certo é que nunca se vislumbrou na classe jornalística uma genuína força interior para enfrentar os seus dramas mais violentos. A saber: a fulanização dos estilos, a degradação dos padrões informativos e, por fim, o esvaziamento das formas de confronto ideológico em favor da celebração quotidiana do conflito mediático. Para compreender esta conjuntura, a dicotomia "liberdade/censura", herdada do antifascismo, continua a ser moralmente incontornável — mas é também simbolicamente escassa para lidar com a nova complexidade das relações entre poder político, práticas jornalísticas e imaginário televisivo.