Naturalmente da novidade vive qualquer festival de cinema, e na 60º edição da Berlinale já se viram, entre outros, os novos filmes de realizadores como Martin Scorsese (Shutter Island, que estreia dentro de dias em Portugal), Noel Baumbach (o criador de A Lula e a Baleia, de quem aqui estreou Greenberg), Thomas Vinterberg (Submarino), Roman Polanski (The Ghost Writer) ou Zhang Ymou (com um título apresentado em tradução inglesa como A Woman, A Gun and a Noodle Shop). Porém, um dos maiores acontecimentos nestes primeiros dias da Berlinale ficou por conta de um dos clássicos maiores da história do cinema alemão que, finalmente, voltou a conhecer projecção na sua versão integral.
Apresentada numa gala no Friedrichstadt Palast, exibida também num ecrã ao ar livre nas Portas de Brandenburgo (numa noite de temperaturas negativas), a versão original de Metropolis, de Fritz Lang foi assim vista pela primeira vez num ecrã europeu desde que que fora retirada das salas, e submetida a um corte de 25 minutos, logo após a sua estreia, em 1927.
Conta a história que, dada a má recepção na estreia, o épico de ficção científica de Fritz Lang foi imediatamente alvo de uma série de cortes, a nova versão mais curta seguindo então para distribuição pelo mundo fora. E apesar de se ter transformado num dos títulos de referência da história do cinema de ficção científica, da sua versão original nunca mais ninguém ouvira falar, as cenas cortadas em 1927 sendo dadas por irremediavelmente perdidas (substituídas até mesmo por cartões com a descrição da acção numa versão restaurada de 2001).
Acontece que, há uns anos, o argentino Fernando Martin Pena (do departamento de cinema do Museu de Arte Latino-Americana na Argentina) ouviu o responsável de um cineclube local a queixar-se da excessiva duração de Metropolis, que tinha visto há uns anos… Mais de duas horas e meia, dizia… Quando a versão conhecida pouco passaria das duas… E nasceu o que mais pareceu uma quimera.
Foram 15 anos de aventura em busca de uma cópia perdida. E que o levaram até ao ano de 1928, quando um distribuidor argentino recebera uma cópia da versão original de Metropolis em Buenos Aires. Como recorda a Hollywood Reporter, a cópia passou depois para um crítico de cinema e este, por sua vez, terá deixado parte da sua colecção a uma instituição estatal, tendo as bobinas chegado ao Museu do Cinema em 1992. Só localizou o filme em 2008, fazendo uma cópia, levando-a até Berlim, onde a mostrou a um grupo restrito… Confirmada a autenticidade da versão original (cruzando o conteúdo das bobinas com o texto do argumento original e a partitura criada por Gottfried Huppertz para acompanhar as imagens), a Fundação Murnau entrou em cena, estabelecendo parcerias e preparando o restauro de uma cópia que se revelava em relativamente mau estado. Em 2010, 83 anos depois de Berlim a ter visto pela primeira vez, a versão original de Metropolis regressou a casa.