As revoluções tecnológicas não bastam para compreender o cinema, que sempre foi (e continua a ser) uma arte de contar histórias — este texto foi publicado no Diário de Notícias (20 de Janeiro), com o título 'Continuar a contar histórias'.
Há qualquer coisa de opressivo no conceito de espectáculo que desemboca em Avatar. Não por causa de Avatar, mas porque se assiste a uma consagração unilateral da “tecnologia” que remonta a A Guerra das Estrelas (1977), de George Lucas. A questão é tanto mais difícil de pensar quanto a sua simples enunciação tende a suscitar um triste infantilismo, hoje em dia à solta na blogosfera: a “crítica” detestaria os grandes espectáculos; o “povo” consagra-os...
Claro que os modelos de espectáculo gerados por Lucas produziram alguns filmes admiráveis, desde as primeiras aventuras de Indiana Jones até à trilogia Matrix. Não são os filmes, “bons” ou “maus”, que estão em causa, muito menos a sua “maior” ou “menor” sofisticação técnica... O que está em causa é que essa visão mascara a energia fundadora do cinema americano que liga David W. Griffith a David Fincher, passando por Preston Sturges, Vincente Minnelli ou Sidney Lumet. Que energia é essa? A arte de contar histórias.
Jason Reitman é um herdeiro directo dessa arte (ironicamente nascido em 1977). O seu trabalho faz-se de histórias genuinamente melodramáticas como a de Nas Nuvens (Up in the Air), conduzidas por uma paixão muito real por seres bem vivos que transportam as ilusões e impasses do nosso presente. A personagem de George Clooney, especialista em despedir pessoas e “reconverter” empresas, é mesmo um sinal muito cru de um mundo em que os valores da economia podem esmagar qualquer centelha do humano. Este é, afinal, um cinema radicalmente político. Sem tirar os pés da terra.
Há qualquer coisa de opressivo no conceito de espectáculo que desemboca em Avatar. Não por causa de Avatar, mas porque se assiste a uma consagração unilateral da “tecnologia” que remonta a A Guerra das Estrelas (1977), de George Lucas. A questão é tanto mais difícil de pensar quanto a sua simples enunciação tende a suscitar um triste infantilismo, hoje em dia à solta na blogosfera: a “crítica” detestaria os grandes espectáculos; o “povo” consagra-os...
Claro que os modelos de espectáculo gerados por Lucas produziram alguns filmes admiráveis, desde as primeiras aventuras de Indiana Jones até à trilogia Matrix. Não são os filmes, “bons” ou “maus”, que estão em causa, muito menos a sua “maior” ou “menor” sofisticação técnica... O que está em causa é que essa visão mascara a energia fundadora do cinema americano que liga David W. Griffith a David Fincher, passando por Preston Sturges, Vincente Minnelli ou Sidney Lumet. Que energia é essa? A arte de contar histórias.
Jason Reitman é um herdeiro directo dessa arte (ironicamente nascido em 1977). O seu trabalho faz-se de histórias genuinamente melodramáticas como a de Nas Nuvens (Up in the Air), conduzidas por uma paixão muito real por seres bem vivos que transportam as ilusões e impasses do nosso presente. A personagem de George Clooney, especialista em despedir pessoas e “reconverter” empresas, é mesmo um sinal muito cru de um mundo em que os valores da economia podem esmagar qualquer centelha do humano. Este é, afinal, um cinema radicalmente político. Sem tirar os pés da terra.