sábado, dezembro 05, 2009

Pink Floyd ou uma história de muros

Desenho de GERALD SCARFE

A propósito do 30º aniversário do álbum The Wall — lançado a 30 de Novem-bro de 1979 — vale a pena perguntar com que muros ainda nos confronta-mos — este texto foi publicado no Diário de Notícias (28 de Novembro), com o título 'A solidão, pedra sobre pedra'.

Os muros não desapareceram do nosso planeta dilacerado. Mas, em termos dramáticos, ou melhor, no país das narrativas, a noção de “muro” quase parece uma reminiscência insólita de uma história pré-digital. Hoje em dia, as tragédias são sobre barreiras virtuais, porventura gigantescas, mas enredadas nos fantasmas do nosso inconsciente. Veja-se a emblemática paisagem cinematográfica de Matrix: tudo se passa, algures, na cabeça de alguém, talvez de um computador.
The Wall, dos Pink Floyd, foi gerado num mundo de muros muito físicos e ameaçadores: pedra sobre pedra. Foi assim que Gerald Scarfe o figurou na capa do álbum, depurando-o numa brancura serena e serenamente ameaçadora. Nos concertos, a banda repetia o cenário e, metodicamente, reduzia-o a escombros.
Quando olhamos para trás, 1979 parece ser uma espécie de fio de prumo de algumas convulsões da nossa Europa, algures a meio das utopias de Maio 68 e da Queda do Muro de Berlim, em 1989. Não por acaso, este é um muro erguido (isto é, cantado e desenhado) para uma história que tem a ver com a educação, ou melhor, com essa pergunta primitiva e fundadora: “Como ensinar alguém?” Dito de outro modo: The Wall é também uma fábula sobre jovens e adultos e as muitas formas de solidão que os unem e separam. Trinta anos depois, a publicidade só nos mostra jovens com telemóveis. E todos eles parecem acreditar que estar online é o mesmo que não haver muros. Como desaprendemos tanto em tão pouco tempo?