quarta-feira, dezembro 09, 2009

Jan Kounen: história e mitologia (2/2)

Este é o registo de uma conversa com o realizador Jan Kounen que serviu de base à entrevista publicada no Diário de Notícias (3 de Dezembro), com o título 'Chanel e Stravinsky possuem uma dimensão mitológica'. [1]

Será que existe um modelo de “cinema europeu” que seja possível definir de forma mais ou menos coerente?
A força da Europa começa nas próprias diferenças culturais que existem no seu interior. É a partir dessa diversidade que é preciso encontrar temas que cheguem ao grande público. Isto sem prejuízo de reconhecer que há “grandes máquinas” de produção (por exemplo, os filmes de "Astérix") que funcionam muito bem a nível europeu. Além do mais, uma marca europeia importante é uma certa liberdade do cineasta, com a ambição que isso implica, e uma menor pressão industrial sobre a própria fabricação do filme. Houve uma época em que, para se fazer um certo tipo de filmes, era preciso ir para os EUA: veja-se o caso de Ridley Scott. Hoje em dia, se um cineasta europeu quer fazer um filme mais “visual”, talvez acabe por decidir ficar na Europa: talvez tenha menos dinheiro, mas sentir-se-á mais livre.

Essa liberdade tem também a ver com a vontade de não se deixar limitar pelas regras da televisão?
Exactamente. Mas também aí as coisas não são lineares. Porque se é verdade que, na Europa, os produtos mais convencionais são normalmente associados à televisão, nos EUA está a acontecer o contrário: há um grande impulso criativo na televisão, por vezes mais que nos filmes.

Em todo o caso, é verdade também que, para muitos filmes, o financiamento televisivo é essencial.
Sem dúvida.

Como foi no caso de Coco Chanel & Igor Stravinsky?
Tivemos o Canal Plus, mas não há outras televisões francesas. Em filmes anteriores, já tive o apoio do canal Arte, mas nesse caso é como se já não fosse televisão, de tal modo favorece o risco criativo dos cineastas.

Que filmes mais o impressionaram recentemente?
Começando pelos franceses, Um Profeta, de Jacques Audiard, parece-me um filme magistral [estreia portuguesa: 31 de Dezembro]. Distrito 9 pareceu-me brilhante, divertido, cheio de níveis de leitura. Vi também 30 minutos de Avatar, de James Cameron [estreia portuguesa: 17 de Dezembro]: daqui a alguns meses, o cinema passará a ser outra coisa.

Está, portanto, optimista em relação às três dimensões?
Não é uma questão de optimismo: estamos mesmo perante uma revolução. Penso que o 3-D vai mudar tudo: daqui a uns dez anos, vamos pensar se faz sentido fazer um filme a duas dimensões, mesmo que seja um drama social passado no interior de um apartamento. Já se tinha evoluído muito na “espacialização” do som, de modo a envolver cada vez mais o espectador; agora, creio que a imagem vai harmonizar-se com os progressos do som. Vamos estar, realmente, no interior de uma história.