Não são enquadráveis em nenhum movimento, nem são figuras que se arrumem num comboio em andamento que não o seu… Porém ao quinto álbum, os canadianos The Hidden Cameras estão longe de ser um nome desconhecido. São um colectivo de formação variável (já por ali passaram elementos dos Arcade Fire ou mesmo Owen Pallett), centrado em torno da voz criativa de Joel Gibb, o seu mentor, principal compositor e vocalista. O seu som é algo que se poderá descrever como pop sinfónica, imponente nas formas convocadas, de horizontes vastos nos caminhos tomados, luminosa no melodismo e directa nas palavras. Origin:Orphan assinala um reencontro da banda com as visões grandiosas de Mississagua Goddam, o disco que os colocou no mapa das atenções há cinco anos. Reencontram-se aqui a grandiosidade nos arranjos de alma sinfonista, a multidão de instrumentos convocada e o festim pop que faz de cada canção um pequeno grande acontecimento. O single que serve de cartão de visita, In The Na (acompanhado por um magnífico teledisco) é claro retrato do que depois o álbum guarda nos restantes momentos do alinhamento. Pop eloquente, revigorante, agitada e agitadora. Mas também um espaço de contrastes, com pólo oposto na espantosa balada (com ecos a memórias clássicas de 60) em Silence Can Be A Headline, que encerra o alinhamento. Em 48 minutos de belas ideias pop, um concentrado de acontecimentos como poucos discos pop sabem conjugar.
The Hidden Cameras
“Origin: Orphan”
Arts & Crafts
4 / 5
Para saber mais: site oficial
Nem toda a música tem de viver do inesperado para surpreender. De resto, nem toda a música tem necessariamente de surpreender para nos agradar… Porém, quando a surpresa mora num disco, o gosto pela descoberta acaba por nele concentrar inevitáveis atenções. É o que, justificadamente, acontece com a estreia do projecto Volcano Choir em Unmap. Em cena não estão mais que Justin Vernon (ou Bon Iver, como nos habituámos a reconhecê-lo) e o colectivo Collections Of Colonies Of Bees. Juntos avançam para território relativamente desconhecido, apostando numa agenda experimental para definir um álbum que nos leva para lá das fronteiras da canção e, claramente, além do que parecia ser a noção de terra firme sobretudo para Vernon (segundo, claro, o que nos mostrara no seu álbum de estreia). Este é um disco que explora as vozes, as texturas em seu redor, trabalha sugestões cénicas e explora ideias nos interstícios da melodia para, ocasionalmente, piscar o olho, mas sempre de longe, a uma ideia de canção. É assim, por exemplo, em Island Is, onde não é descabido falar numa presença estrutural das heranças de um Steve Reich, ou em Still, onde a manipulação electrónica da voz num contexto eléctrico sugere uma curioso debate entre o familiar e o desconhecido. Unmap é, por tudo isto, uma das grandes (e boas) surpresas de 2009.
Volcano Choir
“Unmap”
Jagjagwar / Popstock
4 / 5
Para ouvir: MySpace
Era um desafio. Não apenas o de cantar uma mão cheia de canções de Edith Piaf. Mas, e sobretudo, o de nelas se encontrar a si mesma, procurando um espaço de afirmação de uma interpretação (o que não deixa de ser curioso numa voz que procurou revelar-se através de dois álbuns de composições assinadas por si mesma). Martha Wainwright fez assim questão de focar em Sans Fusils, Ni Souliers, À Paris uma visão muito pessoal do universo de Edith Piaf. Partilhando canções, é certo, mas definindo as suas marcas de presença não apenas na forma de as abordar mas até nas próprias escolhas (onde se afasta do óbvio, optando antes pela selecção daquelas canções com as quais sentiu maior afinidade). Este é um disco significativamente diferente daquele através do qual o seu irmão (Rufus) homenageou recentemente outra grande voz (a de Judy Garland). O encontro com memórias de Piaf foi encenado e gravado ao vivo numa sala pequena, o ambiente mais intimista, as canções sujeitas a novos arranjos. Sobressai a voz. A leitura. Surpreende o facto de respeitar o original francês das letras (Scott Walker e Marc Almond, por exemplo, cantaram Brel em inglês). E, sob a orientação de Hal Wilner, chega-se à 15ª e última faixa do disco com a sensação de missão (bem) cumprida… Mesmo assim, venha a seguir novo álbum de originais (onde Martha claramente brilha mais).
Martha Wainwright
“Sans Fusils, Ni Souliers, À Paris”
Coop / Nuevos Medios
3 / 5
Para saber mais: site oficial
Há cinco anos Vitalic chamou atenções com OK Cowboy, um álbum que espreitava as electrónicas ao serviço da pista de dança em várias frentes (colocando em cena o irresistível My Friend Dario). Seguiu para a estrada, ora em actuações ao vivo, ora em DJ sets. Trabalhou remisturas para nomes como Björk, Moby ou Röyksopp. E, cinco anos depois, finalmente apresenta um sucessor ao seu álbum de estreia. Muito esperado, Flashmob revela-se contudo uma relativa desilusão. O single Poison Lips, que servira para apresentação do disco, deixara bons sinais, mostrando um interesse pop que, herdeiro do que se conhecia do anterior trabalho deste francês (de ascendência italiana), acrescentava novos caminhos e ideias… Há mais momentos interessantes em Flashmob, seja no experimentar da canção electro (facção Fischerspooner) em Your Disco Song, no desenhar de uma construção quase pop, mas sem palavras, em Allan Dellon ou no que parecem ser heranças da genética das primeiras formas da pop electrónica (com vocoder e tudo) em See The Sea (Blue). O álbum, porém, acaba por não ir muito mais adiante, propondo essencialmente manobras práticas, e algumas vezes algo incaracterísticas, para pista de dança. Aquém das expectativas, portanto.
Vitalic
“Flashmob”
Citizen Records
2 / 5
Para ouvir: MySpace
Há 25 anos editavam Ocean Rain, sem dúvida um dos melhores discos pop lançados na década de 80. Um ano antes tinham-nos dado o igualmente marcante Porcupine. De resto, entre 1980 e 87, dos Echo & The Bunnymen chegaram algumas das mais interessantes contribuições para uma ideia de pop alternativa de vistas largas e heranças colhidas entre memórias mais antigas, que então emergia em clima pós-punk. Separaram-se. Assinaram um equívoco em 1990 com outra voz que não a de Ian McCulloch… Reencontraram-se em 1997 e foram até dos raros casos de reuniões das quais nos chegaram novos discos acima dos mínimos olímpicos exigidos perante o estatuto atingido numa primeira vida. Já lá vão 12 anos desde o reencontro, com cinco álbuns entretanto editados. The Fountain é o seu mais recente disco de originais. Não é uma tragédia (já ouvimos bem pior em outras reuniões, para tal bastando recordar discos de uns Bauhaus ou Culture Club nas suas existências 2.0). Mas esta é magra proposta perante uma obra que nos deu já bem melhor… Ocasionalmente sentem-se os ecos dos velhos Bunnymen, mais vezes iluminados pela voz de McCulloch que pela guitarra, por vezes estranhamente incaracterística, de Will Sergeant. Já as canções nunca vencem o patamar da mediania. E é pena…
Echo & The Bunnymen
“The Forest”
Ocean Rain Records / Warner
2 / 5
Para ouvir: MySpace
Também esta semana:
Kraftwerk (caixa), Procol Harum (reedições), Stereophonics, Ryuichi Sakamoto, Soft Machine (live), Kitsouné – Vol 8, Groove Armada, M Pollini (Bach), Micro Audio Waves, Terry Riley (remisturas)
Brevemente:
23 de Novembro: Francisco Ribeiro, Tom Waits (live), Miles Davis (caixa), Britney Spears (best of), Lady GaGa (repackage e novo EP), R.E.M. (live), Landscape (reedições)
30 de Novembro: Tricky, Pixies (caixa), Spiritualized (reedição),Sparks (ed especial vinil), Manu Chao, Blakroc, Rolling Stones (reedição), Atlantic Records (antologia), Foo Fighters, The Cinematics, Morrissey (caixa)
7 de Dezembro: Echo & the Bunnymen (live), Paul McCartney (CD + DVD), Timbaland, Cluster (reedição), Roxy Music (live), The Beatles (USB)
Dezembro: Três Cantos, Pet Shop Boys (EP), Stones (reedição), Joni Mitchell (reedições), Cluster, Judy Garland (live), Animal Collective (EP), Sonic Youth
Janeiro 2010: Vampire Weekend, Magnetic Fields, William Orbit, Laura Veirs, Lindstrom + Christabelle