Em 1986, no seu fabuloso livro Amérique (Grasset), Jean Baudrillard (1929-2007) reflectia metodicamente sobre o valor do simulacro na cultura americana. Por exemplo:
>>> A cultura americana é herdeira dos desertos [o capítulo final do seu livro chama-se, aliás, 'Desert for ever']. Estes não são uma natureza em contraponto às cidades, designam o vazio, a nudez radical que está por detrás de qualquer empreendimento humano. Designam ao mesmo tempo os empreendimentos humanos como uma metáfora desse vazio, e a obra do homem como a continuidade do deserto, a cultura como miragem e como perpetuidade do simulacro. <<<
Baudrillard faz-nos falta, hélas! Isto porque a apoteose do simulacro se vem instalar, agora, nas páginas da revista... Playboy: Marge Simpson, mãe de família e personagem respeitada de uma já clássica série televisiva, vai posar na edição de Novembro da revista de Hugh Hefner. Bem sabemos que ela é uma figura desenhada ou, como dizem algumas notícias mais dadas ao bom senso, "não é real"... Em boa verdade, neste mundo virtual em que, malgré nous, somos obrigados a viver, o real já não é o que era — literalmente.
Os fantasmas das fotografias de Marilyn Monroe [capa], Raquel Welch ou Farrah Fawcett, todas elas consagradas no altar iconográfico do Playboy, surgem-nos cruelmente desvalorizados nas suas variadas e muito honestas formas de nudez. Agora, é a mãe de Bart Simpson — "Ay, caramba!", repetirá o filho, preso nas novas malhas do seu Édipo —, senhora de obstinada pele amarela e cabeleira azul, que se apresenta como bizarro símbolo apaziguador desse "continente negro" (a vida sexual da mulher adulta) para cuja insondável genealogia Freud fez o favor de nos avisar, em 1926 (emblemático ano em que nasceu... Hefner).
Dizem também as notícias que se trata de uma escolha relacionada com o 20º aniversário dos Simpsons, procurando atrair leitores na casa dos 20 anos, já que a maioria está acima dos 35 (pormenor cujo simbolismo convém não banalizar: esta informação foi divulgada por uma mulher, Theresa Hennessey, porta-voz do Playboy). A estratégia não podia ser mais reveladora: de acordo com este ponto de vista, os mais jovens já não têm nenhuma ideia do corpo, a não ser virtual.
>>> The Simpsons: página de Marge.
>>> A cultura americana é herdeira dos desertos [o capítulo final do seu livro chama-se, aliás, 'Desert for ever']. Estes não são uma natureza em contraponto às cidades, designam o vazio, a nudez radical que está por detrás de qualquer empreendimento humano. Designam ao mesmo tempo os empreendimentos humanos como uma metáfora desse vazio, e a obra do homem como a continuidade do deserto, a cultura como miragem e como perpetuidade do simulacro. <<<
Baudrillard faz-nos falta, hélas! Isto porque a apoteose do simulacro se vem instalar, agora, nas páginas da revista... Playboy: Marge Simpson, mãe de família e personagem respeitada de uma já clássica série televisiva, vai posar na edição de Novembro da revista de Hugh Hefner. Bem sabemos que ela é uma figura desenhada ou, como dizem algumas notícias mais dadas ao bom senso, "não é real"... Em boa verdade, neste mundo virtual em que, malgré nous, somos obrigados a viver, o real já não é o que era — literalmente.
Os fantasmas das fotografias de Marilyn Monroe [capa], Raquel Welch ou Farrah Fawcett, todas elas consagradas no altar iconográfico do Playboy, surgem-nos cruelmente desvalorizados nas suas variadas e muito honestas formas de nudez. Agora, é a mãe de Bart Simpson — "Ay, caramba!", repetirá o filho, preso nas novas malhas do seu Édipo —, senhora de obstinada pele amarela e cabeleira azul, que se apresenta como bizarro símbolo apaziguador desse "continente negro" (a vida sexual da mulher adulta) para cuja insondável genealogia Freud fez o favor de nos avisar, em 1926 (emblemático ano em que nasceu... Hefner).
Dizem também as notícias que se trata de uma escolha relacionada com o 20º aniversário dos Simpsons, procurando atrair leitores na casa dos 20 anos, já que a maioria está acima dos 35 (pormenor cujo simbolismo convém não banalizar: esta informação foi divulgada por uma mulher, Theresa Hennessey, porta-voz do Playboy). A estratégia não podia ser mais reveladora: de acordo com este ponto de vista, os mais jovens já não têm nenhuma ideia do corpo, a não ser virtual.
>>> The Simpsons: página de Marge.