Michael Mann é autor de grandes sagas cinematográficas, mas a sua própria carreira tem qualquer coisa de épico; a estreia de Inimigos Públicos [foto de rodagem] é um bom pretexto para recordarmos alguns momentos dessa trajectória — este texto foi publicado no Diário de Notícias (6 de Agosto), com o título 'Um cineasta formado na televisão'.
Por vezes, há qualquer coisa de desconcertante no modo como a fama de algumas personalidades do mundo do cinema acaba por favorecer o desconhecimento da sua própria versatilidade. Assim acontece com Michael Mann (nascido em Chigado, em 1943), cineasta consagrado por vários títulos ligados à tradição do policial, em especial a partir do sucesso internacional de Heat/Cidade sob Pressão (1995), com Al Pacino e Robert de Niro. De facto, Mann foi o primeiro cineasta a filmar a personagem de Hannibal Lecter (consagrada em 1991 através da interpretação de Anthony Hopkins em O Silêncio dos Inocentes, de Jonathan Demme). Aconteceu em 1986, com a adaptação de Dragão Vermelho, primeiro romance da trilogia de Thomas Harris sobre Lecter. Era o actor escocês Brian Cox que interpretava a personagem de Lecter (ainda designado por “Lecktor”), chamando-se o filme Manhunter (entre nós lançado como Caçada ao Amanhecer).
De invulgar subtileza dramática, Manhunter é, hoje em dia, um thriller muito pouco visto, apesar de claramente superior à versão de 2002 do mesmo Dragão Vermelho, dirigida por Brett Ratner. Mas não é essa a única referência esquecida da carreira de Mann. Em 1979, ele dirigiu um telefilme, The Jericho Mile, centrado na história insólita de um condenado a prisão perpétua (Peter Strauss) que mantém um regime obsessivo de treino de corrida, a ponto de se colocar a hipótese de o enviar aos Jogos Olímpicos: o impacto emocional e o sentido espectacular de The Jericho Mile acabaram por valer-lhe a difusão nas salas de cinema de muitos países (em Portugal, estreou-se como Fúria de Vencer).
Aliás, a experiência de Mann no mundo da televisão está longe de ser indiferente para o desenvolvimento do seu trabalho. Aí, ele integrou um sentido prático da rodagem que lhe permite, mesmo quando trabalha com as sofisticadas câmaras digitais da actualidade, manter uma grande espontaneidade e uma permanente capacidade de adaptação aos problemas gerados pela utilização de cenários naturais. Isso está bem expresso na sua “trilogia digital”: Colateral (2004), Miami Vice (2006) e, agora, Inimigos Públicos. Por um lado, são filmes eminentemente experimentais, capazes de tirar o máximo partido de máquinas que estão a alterar de modo significativo as condições de rodagem, em particular no aproveitamento das fontes naturais de luz; por outro lado, isso não impede Mann de ser um cineasta capaz de revalorizar os valores mais tradicionais de Hollywood, a começar pelo elaborado trabalho com os actores.
Por vezes, há qualquer coisa de desconcertante no modo como a fama de algumas personalidades do mundo do cinema acaba por favorecer o desconhecimento da sua própria versatilidade. Assim acontece com Michael Mann (nascido em Chigado, em 1943), cineasta consagrado por vários títulos ligados à tradição do policial, em especial a partir do sucesso internacional de Heat/Cidade sob Pressão (1995), com Al Pacino e Robert de Niro. De facto, Mann foi o primeiro cineasta a filmar a personagem de Hannibal Lecter (consagrada em 1991 através da interpretação de Anthony Hopkins em O Silêncio dos Inocentes, de Jonathan Demme). Aconteceu em 1986, com a adaptação de Dragão Vermelho, primeiro romance da trilogia de Thomas Harris sobre Lecter. Era o actor escocês Brian Cox que interpretava a personagem de Lecter (ainda designado por “Lecktor”), chamando-se o filme Manhunter (entre nós lançado como Caçada ao Amanhecer).
De invulgar subtileza dramática, Manhunter é, hoje em dia, um thriller muito pouco visto, apesar de claramente superior à versão de 2002 do mesmo Dragão Vermelho, dirigida por Brett Ratner. Mas não é essa a única referência esquecida da carreira de Mann. Em 1979, ele dirigiu um telefilme, The Jericho Mile, centrado na história insólita de um condenado a prisão perpétua (Peter Strauss) que mantém um regime obsessivo de treino de corrida, a ponto de se colocar a hipótese de o enviar aos Jogos Olímpicos: o impacto emocional e o sentido espectacular de The Jericho Mile acabaram por valer-lhe a difusão nas salas de cinema de muitos países (em Portugal, estreou-se como Fúria de Vencer).
Aliás, a experiência de Mann no mundo da televisão está longe de ser indiferente para o desenvolvimento do seu trabalho. Aí, ele integrou um sentido prático da rodagem que lhe permite, mesmo quando trabalha com as sofisticadas câmaras digitais da actualidade, manter uma grande espontaneidade e uma permanente capacidade de adaptação aos problemas gerados pela utilização de cenários naturais. Isso está bem expresso na sua “trilogia digital”: Colateral (2004), Miami Vice (2006) e, agora, Inimigos Públicos. Por um lado, são filmes eminentemente experimentais, capazes de tirar o máximo partido de máquinas que estão a alterar de modo significativo as condições de rodagem, em particular no aproveitamento das fontes naturais de luz; por outro lado, isso não impede Mann de ser um cineasta capaz de revalorizar os valores mais tradicionais de Hollywood, a começar pelo elaborado trabalho com os actores.