Cito as informações da Fundação Gulbenkian: "A presença habitual de Sequeira Costa no Grande Auditório tem, este ano, um significado especial. O pianista nasceu no mês de Julho de 1929. Festejará, portanto, em breve, o seu 80º aniversário." Pode dizer-se, por isso, que o concerto de fim de tarde (2 de Junho, 19h00) teve qualquer coisa de celebração de um virtuosismo tão extraordinário quanto contido [com algumas diferenças em relação ao que se anunciava na Net].
A primeira parte do concerto propôs um breve, mas delicioso, trânsito entre classicismo e romantismo, através de Joseph Haydn (Sonata para Piano em Mi bemol maior, n.º 49) e Robert Schumann (Carnaval de Viena, op. 26) — neste último caso, em particular, sublinhe-se o sábio equilíbrio entre o carácter lúdico de alguns momentos e as sugestões de desencanto de outros. Depois do in-tervalo, fomos confrontados com um tríptico de peças que, por assim dizer, progrediam em crescente desafio formal às regras triunfantes do século XIX e também em dificuldade de interpretação. No alinhamento surgiram o francês Claude Debussy (Suite berga-masque), o espanhol Joaquín Turina (Danças Fan-tásticas, op. 22) e o russo Sergey Lyapunov (Estu-do de execução transcendente N.º 10, em Si bemol menor, Lesghinka): formas e contrastes de uma música em convulsão, especialmente ousada na peça de Lyapunov [foto], uma longa frase dramá-tica, percorrendo inusitados labirintos emocionais.
Há em Sequeira Costa o pudor admirável de quem não força a sobreposição do seu ego às especificidades da obra interpretada. Dir-se-ia que ele começa por adoptar a atitude "neutra" de quem acredita sempre que a interpretação, mesmo se entendida como transfiguração, visa a origem mais primitiva do trabalho do compositor. Num sentido desconcertante, porventura próximo do fantástico, tudo se passa como se a precisão elegante do seu toucher nos devolvesse a obra em estado nascente, virginal. Uma maravilha, um concerto inesquecível.
Há em Sequeira Costa o pudor admirável de quem não força a sobreposição do seu ego às especificidades da obra interpretada. Dir-se-ia que ele começa por adoptar a atitude "neutra" de quem acredita sempre que a interpretação, mesmo se entendida como transfiguração, visa a origem mais primitiva do trabalho do compositor. Num sentido desconcertante, porventura próximo do fantástico, tudo se passa como se a precisão elegante do seu toucher nos devolvesse a obra em estado nascente, virginal. Uma maravilha, um concerto inesquecível.