terça-feira, maio 05, 2009

Discos da semana, 5 de Maio

E eis mais um exemplo do mundo de possibilidades que se abre quando um músico partilha escolas. DM Stith (David Michael, os dois nomes a que correspondem as duas iniciais) é mais um músico nascido em escola “clássica” (pai maestro, mãe pianista, avô professor de música, irmãs que cantam ópera), entretanto “seduzido” pelos caminhos da cultura pop(ular). Começou por ter uma banda de noise. Mais tarde, já em Nova Iorque, foi desafiado por Shara Worden (My Brightest Diamond) para criar as suas canções. Foram surgindo, aos poucos. Ganhando corpo e vida, materializando-se agora num primeiro álbum. DM Stith traz-nos, em Heavy Ghost, o disco que há muito esperamos depois do magistral Illinois, de Sufjan Stevens. Ou seja, um álbum onde melodias e texturas são co-protagonistas, feito de uma música a que poderíamos chamar “pop de câmara”, com janelas que tanto abrem para o cheiro vivo da terra com alma folk, como revelam vistas largas sobre os universos de uma música que se não fecha em compartimentos e olha o todo, da tradição da canção popular até aos domínios da música contemporânea. Já o compararam à “alma” de um Antony Hegarty, à fragilidade de um Jeff Buckley, à sede da experimentação de uns Grizzly Bear. É tudo isto, mas também um explorador de cenografias, um maestro atento que coordena, sem nunca perder o controlo dos ingredientes, uma “orquestra de acontecimentos”. A busca das formas traduz, inclusivamente, uma noção de rigor racional, característica nem sempre aprecidada em terrenpo onde muitas vezes a emoção dita regras. O disco revela talvez mais investimento nos arranjos, na demanda de uma arte final coererente de fio a pavio. Mas, conhenhamos, parte de bases de compoisção suficientemente seguras para sustentar tudo o que, sobre o palco, depois lança. Mais ainda que no promissor EP de estreia (Curtain Speech, editado no ano passado), Heavy Ghost é, entre a pontual evocação da frágil claridade de um Nick Drake e o gosto pelo detalhe de uns Talk Talk (fase Spirit Of Eden), um desafio de sensações que se saboreia com o prazer de descoberta audição após audição.
DM Stith
“Heavy Ghost”

Asthmatic Kitty
5 / 5
Para ouvir: MySpace


Este é o quarto álbum de originais que Bob Dylan edita depois do momento de renascimento (criativo e mediático) que fez de Time Of Of Mind, de 1996, um dos seus discos de absoluta referência. Três anos depois do magnífico Modern Times, Together Through Life surgiu quase inespreradamente, inclusivamente para o próprio Dylan. Há tempos Olivier Dahan pediu-lhe uma canção para um novo filme. Surgiu assim Life Is Hard (claramente o tema-chave e o mais interessante de todo o disco), acabando a canção por definir o caminho que a composição depois tomaria. Com escrita partilhada com Robert Hunt (letrista dos Grateful Dead) e contando com músicos dos Los Lobos ou dos Heartbreakers (de Tom Petty) na banda de estúdio, o disco acabou por se revelar como mais um capítulo de uma etapa de reencontro com uma relação primordial com os bules que, na verdade, tem dominado a obra recente do músico. Ecos de gravações da Chess Records moram entre as referências que definem o rumo que estas canções seguiram definindo um conjunto que não repete o aprumo de ideias do álbum anterior mas que, tal como em Love and Theft (2001), assegura tranquila e segura sucessão a um disco de excepção.
Bob Dylan
“Together Through Life”

CBS / Sony Music
3 / 5
Para ouvir: MySpace


Essencialmente reconhecido como produtor e DJ, o canadiano Tiga esperou vários anos até gravar um disco de originais, em nome próprio. Tinha já somado êxitos de dimensão considerável (como a versão de Sunglasses at Night, em plena euforia electroclash), mas só em 2006 se aventurou na gravação de algo com maior fôlego. Três anos depois de uma interessante estreia em Sexor, o novo Ciao! procura novos passos em direcções não muito distantes, partilhando (tal como no primeiro álbum), linguagens da música de dança com um evidente encanto pela canção pop. Como em experiências anteriores, o trabalho de colaboração serve a abertura de portas e posterior exploração de novos horizontes. Em concreto, desta vez desafia nomes como os Soulwax, Gonzales, Jasper Dahlback, Jori Hulkkonen ou James Murphy, neles encontrando parcerias através das quais define em Ciao! um conjunto híbrido que, entre a pop, o electro e as descendências da house, traduz um segundo retrato de um espírito que procura mais que apenas a boa gestão de uma pista de dança. Entre a folia pop de um Shoes ou Luxury e instantes que confirmam um conhecedor das exigências da noite, um seguro segundo disco.
Tiga
“Ciao!”

PIAS / Edel
3 / 5
Para ouvir: MySpace


Passaram algo a leste das atenções quando editaram um primeiro álbum em 2005. Há dois anos, contudo, e então já com nomes como o de David Lynch entre uma boa carteira de admiradores, The Bird Of Music fez das Au Revoir Simone um dos nomes mais falados do ano. Agora lançam um terceiro disco que, na verdade, nada mais parece procurar que uma sugestão de manutenção. Still Night Still Light é como uma continuação directa do que nos mostraram no álbum anterior. Composto essencialmente na estrada, naqueles que devem ter sido intensos meses de vida feita entre palcos e eventos mediáticos, vida nova para uma banda subitamente feita centro de atenções em terreno indie, o disco é uma simples nova colecção de canções em tudo fieis às referências e preocupações deste trio de Brooklyn. Aqui se ouve uma vez mais uma pop electrónica leve, minimalista, ecoando ainda à distância (contudo com mais carne sobre os ossos) memórias dos Young Marble Giants. Talvez menos luminoso que o disco de 2007 (não revelando as frestas de festa pop dançável que ali por vezes emergiam), talvez procurando um equilíbrio que a vida em digressão não traz... Mas longe de desiludir.
Au Revoir Simone
“Still Night, Still Light”

Moshi Moshi / Popstock
3 / 5
Para ouvir: MySpace


Até as melhores ideias por vezes atingem um limiar de exaustão. E é nesse ponto que encontramos One Day, o sexto álbum em nome próprio do alemão Maximilian Hecker. Quando se revelou, em 2001, através do cativante Infinite Love Songs, apresentava-se como um cantautor de uma nova geração pop europeia nascida da assimilação das melhores ideias de finais de 90, tomando como referência não muito distante os terrenos de melancoia elegante dos franceses Air. No disco seguinte, Rose (2003) atingia a plenitude de uma linguagem com teatralidade que diríamos de bom melodrama, numa colecção de canções que ainda hoje deve ser evocada como a sua obra de referência. One Day (agora lançado entre nós) surgiu em finais do ano passado, depois de discos menores editados em 2006 e 2007. Na verdade em nada o disco muda o cenário. Mantém viva uma ideia pop que vive de ecenações (por vezes barrocas) para canções protagonizadas por uma voz frágil, mas está longe de repetir o requinte das canções de outros tempos. Há competência instrumental e na produção, mas a escrita, nestes moldes, atinge aqui um patamar próximo da inconsequência.
Maximilian Hecker
“One Day”
Louisville Records
2 / 5
Para ouvir: MySpace


Também esta semana:
Conor Oberst, Fischerspooner, Maccabees, Thomas Dolby (best of), St. Vincent, Kronos Quartet, Miss Kittin + The Hacker, Sigur Rós (reedição), Lhasa, Scott Matthew

Brevemente:
11 de Maio: Philip Glass, Graham Coxon, Maximo Park, Green Day, St Etienne (reedições), Kevin Saunderson, Laurent Garnier
18 de Maio: The Field, Manic Street Preachers, Madness, Passion Pit, Tangerine Dream (reedições)
25 de Maio: Grizzly Bear, Phoenix, Siouxsie & The Banshees (live), Iggy Pop

Maio: John Vanderslice, Maximo Park
Junho: Patrick Wolf, Eels, Iggy Pop, Jeff Buckley, Sonic Youth, Tortoise, Little Boots, Duran Duran (reedições + DVD), VV Brown