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De facto, mais do que nunca, pertenceria à classe política — e às suas políticas culturais — assumir o que todos sabemos há décadas: que tal maniqueísmo só tem servido para agravar conflitos pessoais e institucionais no espaço multifacetado do cinema português, adiando toda e qualquer evolução no sentido de gerar estruturas mais sãs, mais estáveis e que dêem mais hipóteses de trabalho a mais pessoas.
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E a sua versão do conto de Eça de Queiroz é uma pequena pérola gerada por essa crença simples, mas radical, que leva a encarar o cinema como uma linguagem sempre em aberto. Por um lado, Oliveira transfere a acção para o nosso presente, instalando um delicioso curto-circuito de coincidências e anacronismos; por outro lado, filma o impulso amoroso como a suprema ilusão desta nossa arte muito humana de confundirmos o desejo com a realidade da coisa desejada. Singular ou excêntrico, como quiserem. Em todo o caso, a prova de que o cinema continua a valer a pena, não havendo nenhuma razão, nem artística nem económica, para se entregar à mediocridade reinante da televisão.