sexta-feira, abril 17, 2009

Animal Collective DIY

My Girls, dos Animal Collective, já tinha um teledisco oficial. Agora, passou a ter um teledisco assinado por Rob Chesnutt — assim se chama o autor de um espantoso exercício de transfiguração visual da canção da banda de Baltimore, disponível no Vimeo [e colocado aqui em baixo].
Se queríamos definir o alargado conceito contemporâneo de Do It Yourself, não poderia haver exemplo mais revelador: um amador (?) que, na paisagem imensa, sem fronteiras da WWW, se apropria de uma matéria criada por outros (uma canção), chamando-a "sua" e, depois de um sofisticado labor formal, devolvendo-a ao mundo.
O fenómeno é tanto mais empolgante quanto, obviamente, Rob Chesnutt não é, nem de longe nem de perto, um futurista pueril, "viciado" nos artifícios da técnica, confundindo a mera proliferação de efeitos com a verdadeira construção de uma narrativa (porque um teledisco é também uma narrativa). Além do mais, convenhamos que não é todos os dias que encontramos um objecto deste género que cite (aos 2m 47s) um plano de Marcel Dalio em A Regra do Jogo (1939), de Jean Renoir.
Aliás, o teledisco nasce de um olhar genuinamente cinéfilo, sendo quase inevitável evocar dois paralelismos formais mais evidentes:
1) - a divisão do ecrã em três zonas sucessivas, à maneira do clássico Cinerama, mas também das experiências desenvolvidas em Woodstock (1970), de Michael Wadleigh (recorde-se que entre os montadores do filme estavam Martin Scorsese e Thelma Schoonmaker).
2) - a divisão do ecrã em quatro "quadrados", exponenciando as hipóteses abertas por Mike Figgis em Timecode (2000).
Seja como for, não se trata de enumerar "cauções" para o trabalho de Chesnutt (até porque, muito legitimamente, o autor pode ser o primeiro a não se reconhecer nas referências evocadas). Trata-se, isso sim, de celebrar a vitalidade de um objecto que ilustra um espaço criativo em que não apenas se diluem as fronteiras entre cultura "industrial" e cultura "amadora", mas em que se celebram as radiosas possibilidades de interacção visual com as matérias musicais.
Nessa perspectiva, este My Girls reflecte uma visceral componente poética do nosso presente: a certeza angustiada, mas feliz, de que qualquer ligação entre imagens e sons pode gerar uma nova aventura formal e sensorial — como se o quotidiano tivesse passado a integrar os ziguezagues temporais de uma paisagem de museu.

[agradecemos o mail de André Valentim Almeida]


Animal Collective - My Girls from Rob Chesnutt on Vimeo.