E se Steven Soderbergh tivesse filmado, não exactamente uma biografia de Che Guevara, mas uma metódica, obsessiva e, à sua maneira, irónica anti-biografia?
Quer isso dizer que Che é um filme que, para além da complexidade ideológica e política da personagem, recusa lidar com a herança factual do próprio Che Guevara, "inventando" outra personagem? Não exactamente. A questão é outra. E, sobretudo, é de outra natureza: Che, convém dizê-lo sem ambiguidades, é um filme cujo radicalismo político provém, não de qualquer colagem à sua personagem central, mas sim de uma paciente resistência ao modelo biográfico que as televisões tentam impor. Nesse modelo, não há lugar para mais nada a não ser uma linguagem de patético determinismo — as personagens televisivas não existem, a não ser para confirmarem um "destino" previamente estabelecido.
Ora, o Che de Soderbergh é alguém que, momento a momento escapa a qualquer matriz (ideológica, dramática, mitológica) em que o possamos inserir. É esse, aliás, o prodigioso trabalho de Benicio Del Toro como intérprete principal: através das suas palavras, aos seus silêncios, dos seus gestos carregados de simbolismo e de muitos outros de insólita banalidade, assistimos à simples pose do humano como factor que a história contém e, ao mesmo tempo, dela se escapa para afirmar a irredutibilidade do indivíduo — Che é um filme sobre Che Guevara mas, mais do que isso, sobre as nossas relações com a história.
Quer isso dizer que Che é um filme que, para além da complexidade ideológica e política da personagem, recusa lidar com a herança factual do próprio Che Guevara, "inventando" outra personagem? Não exactamente. A questão é outra. E, sobretudo, é de outra natureza: Che, convém dizê-lo sem ambiguidades, é um filme cujo radicalismo político provém, não de qualquer colagem à sua personagem central, mas sim de uma paciente resistência ao modelo biográfico que as televisões tentam impor. Nesse modelo, não há lugar para mais nada a não ser uma linguagem de patético determinismo — as personagens televisivas não existem, a não ser para confirmarem um "destino" previamente estabelecido.
Ora, o Che de Soderbergh é alguém que, momento a momento escapa a qualquer matriz (ideológica, dramática, mitológica) em que o possamos inserir. É esse, aliás, o prodigioso trabalho de Benicio Del Toro como intérprete principal: através das suas palavras, aos seus silêncios, dos seus gestos carregados de simbolismo e de muitos outros de insólita banalidade, assistimos à simples pose do humano como factor que a história contém e, ao mesmo tempo, dela se escapa para afirmar a irredutibilidade do indivíduo — Che é um filme sobre Che Guevara mas, mais do que isso, sobre as nossas relações com a história.