Com a adaptação da sua própria peça, Dúvida, John Patrick Shanley recupera um cinema eminentemente ligado aos poderes da palavra e às suas ambivalências. Logo também às qualidades de representação de actores como Meryl Streep e Philip Seymour Hoffman [foto], ou ainda de excelentes secundárias como Amy Adams e Viola Davis — este texto foi publicado no Diário de Notícias (6 de Fevereiro), com o título 'Efeitos e actores especiais'.
Há uma velha máxima que diz que, em cinema, o melhor efeito especial é o ser humano, quer dizer, os actores. Convenhamos que não é uma ideia muito acarinhada nos nossos dias, sobretudo se pensarmos que há todo um público (des)educado para pensar que o “verdadeiro” cinema acontece sempre que duas imagens nos oferecem pelo menos três explosões...
Dúvida não será exactamente um dos filmes mais perfeitos que já se fizeram sobre o conceito católico de culpa e as questões morais que a ela se associam (afinal de contas, convém não esquecer que, em 1953, Alfred Hitchcock dirigiu esse filme sublime que se chama Confesso, com Montgomery Clift). Seja como for, ao adaptar a sua própria peça, o trabalho de John Patrick Shanley possui o mérito de revalorizar um cinema em que a palavra emerge como matéria vital da acção. Em boa verdade, deveremos mesmo corrigir essa asserção: a palavra acaba por se confundir com a própria acção, no sentido em que, ao falarem, as personagens jogam todos os trunfos da sua identidade.
As peripécias do filme (situado em 1964) remetem-nos para um tempo com inevitáveis ecos simbólicos na actualidade. Estamos perante as feridas interiores de uma América marcada pela morte brutal de John Kennedy e, ao mesmo tempo, vivendo um processo imensamente complexo de interrogação dos seus valores morais, com especial incidência no estatuto dos afro-americanos. Nesta perspectiva, Dúvida recupera o olhar crítico do melhor “cinema social” dos anos 50/60 ligado a nomes tão díspares como Otto Preminger ou Sidney Lumet.
Há uma velha máxima que diz que, em cinema, o melhor efeito especial é o ser humano, quer dizer, os actores. Convenhamos que não é uma ideia muito acarinhada nos nossos dias, sobretudo se pensarmos que há todo um público (des)educado para pensar que o “verdadeiro” cinema acontece sempre que duas imagens nos oferecem pelo menos três explosões...
Dúvida não será exactamente um dos filmes mais perfeitos que já se fizeram sobre o conceito católico de culpa e as questões morais que a ela se associam (afinal de contas, convém não esquecer que, em 1953, Alfred Hitchcock dirigiu esse filme sublime que se chama Confesso, com Montgomery Clift). Seja como for, ao adaptar a sua própria peça, o trabalho de John Patrick Shanley possui o mérito de revalorizar um cinema em que a palavra emerge como matéria vital da acção. Em boa verdade, deveremos mesmo corrigir essa asserção: a palavra acaba por se confundir com a própria acção, no sentido em que, ao falarem, as personagens jogam todos os trunfos da sua identidade.
As peripécias do filme (situado em 1964) remetem-nos para um tempo com inevitáveis ecos simbólicos na actualidade. Estamos perante as feridas interiores de uma América marcada pela morte brutal de John Kennedy e, ao mesmo tempo, vivendo um processo imensamente complexo de interrogação dos seus valores morais, com especial incidência no estatuto dos afro-americanos. Nesta perspectiva, Dúvida recupera o olhar crítico do melhor “cinema social” dos anos 50/60 ligado a nomes tão díspares como Otto Preminger ou Sidney Lumet.