A “invenção” de uma noção de música americana foi um processo que ganhou corpo e visibilidade na primeira metade do século XX, herdando formas e ideias da tradoção clássica ocidental, acrescentando marcas de identidade culturais que espelham não apenas a reunião de culturas e experiências que foram construindo a América, mas também a descoberta do seu espaço. Aaron Copland (1900-1990) conta-se entre os compositores cuja obra mais contribuiu para essa revelação, influenciando directamente tantos outros, num espectro vasto que vai de Leonard Benstein ao mundo da música para cinema (com o qual o próprio também colaborou). Várias são as obras de Copland que reflectem essa demanda pela construção de uma identidade Americana na música, uma delas sendo Appalachian Spring, um bailado criado em 1944 que depois ganhou vida própria nas salas de concerto na forma de uma suite. E não há melhor forma de contactar com esta obra de Copland, que escutá-la em gravação dirigida por um dos maiores divulgadores da sua música: Leonard Bernstein. À frente da New York Philarmonic, em gravações dos anos 50 e 60, um dos dois discos dedicados à música de Copland integrados na série Bernstein Century junta a Appalachian Spring os não menos “americanos” Rodeo, Billy The Kid e Fanfarre For The Common Man.
Aaron Copland é um nome admirado entre os demais compositores norte-americanos, A sua música escuta com frequência ideias colhidas entre tradições folk, revelando um interesse pela expressão da geografia do país e das gentes. O cinema descobriu-o cedo. Chamou-o a colaborar em diversas ocasiões. E da sua música saiu um verdadeiro livro de estilo que ensinou muitos outros compositores a procurar formas de retratar pelo som a paisagem americana. Leonard Bernstein foi desde muito cedo um dos maiores entusiastas da obra de Copland, dele a sua música colhendo uma série de lições, nomeadamente a versátil capacidade em absorver os estímulos do lugar, das gentes e tempo, o passado e o moderno, para traduzir uma noção de personalidade americana. Conheceram-se em finais dos anos 30, numa etapa em que Copland procurava novas formas musicais e, sobretudo, o desejo de comunicar com o público através das suas composições. Foi Nadia Boulanger, a célere professora, quem levou Copland a reflectir sobre música para servir a dança. Desses primeiros desafios nasceram as bases para obras como Billy The Kid (1938), Rodeo (1942) ou Appalachian Spring (1944).
Appalachian Spring nasceu directamente de um pedido para um bailado pela coreógrafa Martha Graham. A música ilustra uma história com acção perto do ano 1800, entre pioneiros. É uma celebração da chegada da primavera, assinalada em festa junto a um celeiro, juntando entre outras figuras um jovem casal e um pregador. O título Appalachian Spring decorre de uma sugestão de Martha Graham, com base no poema The Bridge, de Hart Crane. A obra é uma homenagem à América rural, dotado de um lirismo evidente, transportando a evocação da ideia para a dimensão humana. Luminosa, é uma música de vigor, de juventude e optimismo. O tema Air And Simple Gifts, que John Williams arranjou para ser interpretado na posse de Barack Obama, tem por base um hino do século XIX que Copland cita e integra em Appalachian Spring.
Imagens de uma interpretação de um excerto de Appalachian Spring, por elementos da Norwalk Symphony.