
Em 2005, Angelina Jolie e Brad Pitt protagonizaram um remake de uma comédia realizada por Alfred Hitchcock em 1941: a cópia chamava-se, tal como o original, Mr. & Mrs. Smith. Não quero legitimar as vulgaridades mediáticas que o casal de actores costuma atrair (até porque sou grande admirador de ambos), mas o filme era, de facto, um absoluto disparate. E tinha uma gaffe de que nunca me esqueci. Toda a sua promoção se baseava numa informação muito precisa: Jolie e Pitt interpretam assassinos profissionais, até que, um dia, cada um deles recebe a missão de matar o outro. Ora, apesar de todos os trailers e textos sobre o filme nos dizerem isso mesmo, dentro do próprio filme tal informação surgia já depois de uma boa hora de duração e era apresentada como... uma novidade de grande dramatismo!

Um dos aspectos mais estimulantes do texto de Coe tem a ver com a inspiração mais remota da mise en scène de Hitchcock. Assim, mesmo se é verdade que ele sempre foi um criador atento às convulsões técnicas, o certo é que o essencial do dispositivo “hitchcockiano” provém dos tempos heróicos do cinema mudo e, em particular, de uma necessidade vital: a de fazer passar informações e emoções, certezas e dúvidas, apenas através das imagens.

Hoje em dia, muitos filmes (e também muitas formas de jornalismo, há que reconhecê-lo) menosprezam a questão da duração na relação do espectador com os filmes. Há mesmo uma ideologia corrente, preguiçosa e infantilista, que tenta impor uma visão bruta do cinema: muitas explosões e muitos efeitos especiais seriam “sempre” sinónimo de grande espectáculo... Uma tristeza, enfim: muitas vezes o exibicionismo da técnica não passa de uma agitação histérica para fingir que acontece alguma coisa. Hitchcock, decididamente, faz-nos falta. Vejam os DVD.