
Embora por vias obviamente diversas, ambos os filmes se confron-tam com uma questão eminentemente moderna: como (re)construir o espaço dramático a partir de um olhar enraizado na fragili-dade "realista" do quotidiano? No caso indiano, assistimos a uma intensificação dos dados materiais que, surpreendentemente, abre o filme para uma iconografia festiva e sensual (as cores das paisa-gens, o sangue, a presença dos animais, etc.) a que talvez pos-samos chamar "surrealista". No filme português, o contraponto entre o automóvel e a visão (ou o pressentimento) do mar cria um ambíguo sentimento do tempo, a meio caminho entre a solidão partilhada e a nitidez indizível da morte — algo cujo assombramento apetece aproximar da serena teatralidade do fado.

(Um precalço que é sempre penalizador e corre o risco de desgastar a relação do festival com o público: a noite foi sofrendo sucessivos atrasos e a sessão da competição nacional, marcada para as 23h00, começou cerca da meia noite e vinte).