Concluímos hoje a publicação de uma entrevista com Jason Pierce, dos Spiritualized, que serviu de base a um artigo publicado a 11 de Junho no DN.
De onde vem o interesse pelos arranjos mais elaborados que são há muito uma característica do som dos Spiritualized?
Vem da música clássica, naturalmente. Mas tem a ver com o mundo de possibilidades que abrem a uma canção. Gosto de trabalhar com harmonias e com instrumentos menos habituais. Gosto de procurar soluções menos vulgares.
O trabalho dos compositores minimalistas interessa-o?
Talvez seja fácil identificar esse interesse, sim. Mas também poderá não ser complicado reconhecer aí uma relação com os Velvet Underground, e a figura de John Cale em particular. E daí, para o La Monte Young...
100 Bars, por exemplo, pode ser associado a essas genéticas minimalistas?
Talvez, mas é uma peça talvez simplista. Um simples acorde, se puder ser tocado por um período de tempo infinito, tornar-se-á no acorde mais importante do mundo... Havia ali um pouco dessa ideia... Mas não me colocaria ao nível desses outros compositores. Nem o sonho fazer. E reconheço algumas das minhas limitações como, por exemplo, na guitarra.
Mas são suas, as ideias...
Sim, mas não fico sentado à espera que me apareçam ideias pela frente. Tento procurar. Mas como se procura? Podemos entrar num bar qualquer deste mundo, e ouvimos uma canção a ser tocada. O que faz aquela magia? Como se procura? Como a encontro? Isso é o que me interessa...
Descreveria essas demandas como uma obsessão?
Sim, são uma obsessão. Em todo o sentido da palavra.
A ponto de se distrair e não reparar no que lhe passa ao lado?
Sim, exactamente.
Como lidou com o facto de, há 11 anos, Ladies And Gentleman We Are Floating In Space se ter transformado, de repente, num caso tão referido e destacado nos media?
Não lidei muito com a situação e em nada me revi nela. Assim como não revejo hoje. Era bem estranho. Sobretudo porque era algo que estava fora do meu controle. Lembro-me de ouvir toda a gente me dizer que o álbum era magnífico. Mas não era assim tanto! É um acaso... Mas que sabem bem. Como está a saber bem com este Songs In A & E, que resulta de tudo aquilo a que me dediquei nos últimos cinco anos. É espantoso... Mas não vejo nada disto como uma “recompensa”. Não é uma recompensa. Porque já gosto do disco desde há três anos...
Mas gosta que lhe digam que ouvir um disco seu fez alguém sentir algo especial?
Sim, isso é espantoso. É a sensação mais espantosa.
Que discos o fizeram sentir assim, como ouvinte?
Muitos... Os Stooges, Washington Phillips... A lista é enorme. E não acabou ainda...
E ouve a sua música? Regressa aos seus discos ou deixa-os ficar na prateleira?
Ouço-os muito raramente. Mas sempre fui assim. Estou sempre tão obcecado pelo pormenor quando estou a trabalhar neles. Ao ponto de ser quase destrutivo. E afasto-me quando finalmente são editados.
Sente que o disco gravado é a obra terminada?
É uma cápsula que encerra o que ali está. Tem a sua alma, as suas emoções... Interessa-me fazer discos que sejam como romances que reportagem. Não quero que sejam o retrato do que era há cinco anos... Tento captar mais que isso. É assim que as coisas fazem sentido para mim.
A sua música há muito que pedia uma relação com o cinema. Finalmente aconteceu, num filme do realizador Harmony Korine. Como recorda a experiência?
Espantosa. E Harmony Korine é uma figura espantosa.
Usaria a sua música já gravada em cinema? Ou pensou-a apenas como uma ideia de som?
Poderia fazer sentido, mas teria de me relacionar com as imagens. Com Harmony Korine foi libertador. Não era o meu projecto. Era o dele. E isso deu à música uma outra liberdade.