O título escolhido para o encerramento oficial do 61.º Festival de Cannes — What Just Happened?, de Barry Levinson — veio instalar um perverso jogo de espelhos: esta é a história da agitadíssima pós-produção de um filme americano que visa a passagem em Cannes como um momento decisivo da sua promoção internacional. Aliás, a acção desemboca mesmo na Cote d'Azur e no Palácio dos Festivais (ainda que "reconstituido" nos EUA...).
Convenhamos que as expectativas dominantes eram, no mínimo, cépticas. What Just Happened? tinha saido do Festival de Sundance (em Janeiro) com a sua imagem muito abalada e nem mesmo o elenco — incluindo Robert De Niro, Catherine Keener [ambos na foto], Robin Wright Penn, Stanley Tucci, John Turturro, Sean Penn e Bruce Willis, estes dois últimos nos seus próprios papéis — parecia poder salvar a vida pública do projecto. O certo é que estamos perante uma curiosa visão do interior de Hollywood, algures entre o desencanto romântico e a revolta cáustica, confirmando que o género — "o-cinema-dentro-do-cinema" — continua a ser um registo atraente para alguns cineastas americanos contemporâneos.
A esse propósito, vale a pena recordar que Levinson dirigiu, por exemplo, Wag the Dog/Manobras na Casa Branca (1997), em cujo argumento trabalhou David Mamet, precisamente um filme em que Hollywood surgia nas suas alianças nem sempre muito cristalinas com o poder político. Agora, trata-se de definir uma tapeçaria de personagens cuja sobrevivência, nem que seja no plano emocional, se joga através dos filmes e respectivos artifícios — e, no fundo, um filme de amarga melancolia.