Como vai o debate cultural em Portugal? Mal.
Porquê? Por três razões fundamentais:1) - porque poucas entidades políticas aceitam discutir a instância cultural no interior das prioridades económicas;
2) - porque quase toda a classe política é indiferente ao poder cultural da televisão;
3) - porque, em termos globais, a televisão impõe todos os dias uma cultura da futilidade, do arrivismo individual e do pânico colectivo.
***É neste contexto de muitas formas de irresponsabilidade (e irresponsabilização) que temos um ministro da Cultura, António Pinto Ribeiro, que em entrevista à SIC Notícias, veio falar dos conteúdos emitidos pela RTP. E disse que "poderia haver uma parceria [entre ministérios] em termos de intervenção no que diz respeito aos conteúdos", acrescentando que "ambiciona uma coordenação de ministérios para que haja uma intervenção cultural com a RTP."
***Convém dizer algo de muito singelo, sem dramatismos especulativos, serenamente: na área da governação em Portugal, as palavras de Pinto Ribeiro representam um gesto ideológico genuinamente revolucionário. Finalmente, um governante tem a coragem básica, mas vital, de dizer o que há muito sabemos, mas que quase sempre é recalcado pela maioria dos agentes políticos e económicos: a televisão é um objecto cultural, não porque transmita "bailado" ou "ópera", mas porque veicula valores (do "Preço Certo" ao futebol).
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Não sabemos que pensamentos ou propostas poderão surgir desta vontade política. Em todo o caso, seria uma estupidez dissolver esta atitude eminentemente criativa no tom mais ou menos maniqueísta (entenda-se: televisivo, hélas!) com que a classe política, genericamente, se coloca "pró" ou "contra" o Governo liderado por José Sócrates. Pinto Ribeiro veio tão só lembrar a evidência política da televisão e do fazer televisão. Que os ideólogos do "divertimento-sem-consequências" se calem ou, como todos desejamos, façam um esforço para ter ideias mais interessantes. Na pior das hipóteses, façam um esforço para ter ideias.