Lana Turner. Reparem no prodigioso jogo de luz e sombras da direcção fotográfica do genial Russell Metty, em Imitação da Vida (1959), de Douglas Sirk — actualmente em reposição em Lisboa, no Nimas. A cópia em exibição, apesar de nova, tem algumas limitações de qualidade, sobretudo por causa de um certo "esmagamento" das nuances cromáticas (provavelmente, este é um filme sujo restauro a partir do negativo original continua por fazer). Seja como for, isso não anula a fruição de um princípio essencial: mais do que "iluminar", a fotografia emerge como um tecido de luz que se abate sobre todas as superfícies do mundo — incluindo os actores —, criando zonas de visibilidade/invisibilidade que rimam com outros tantos sobressaltos dramáticos.
Baseado num romance muito popular de Fannie Hurst, Imi-tação da Vida é uma dessas obras-primas que continuam a fazer justiça à nobreza do mais denegrido dos géneros cinema-tográficos: o melodrama (não, decididamente, a telenovela das nove da noite é tudo menos melodramática...). Com uma elegância homóloga à do seu director de fotografia, Sirk filma uma história em que a questão do racismo surge perversamente "invertida" — uma jovem branca, filha de uma mulher negra e um pai branco, vive empenhada em recusar a cor da sua mãe —, dando uma lição de política simbólica: o quotidiano é uma paisagem imensa de tensões e contradições onde, apesar de tudo, a noção de felicidade continua a mobilizar os humanos. Ponto nada secundário: para os ambientes dramáticos de Imitação da Vida, a música de Frank Skinner é vital — um pouco como a fotografia de Metty, a partitura de Skinner [capa original da banda sonora aqui ao lado] é um notável exercício de melodia e contraponto, ocultação e revelação.