Como pensou a passagem da sua música do estúdio para o palco?
Os instrumentos de música acústica foram criados para a performance, mas os de música electrónica surgiram no laboratório, nos estúdios. Não para a performance, mas para a experimentação. E foi preciso, depois, pensar como levá-los ao palco. Estar duas horas atrás de um laptop não é a coisa mais sexy do mundo em palco! Como levar, então, o lado físico dos instrumentos do rock, ao palco de um concerto de música electrónica? Procurei, então, uma certa correspondência visual com a música que faço. Instintivamente pensei na ópera. Os compositores abordavam cenógrafos, carpinteiros, pintores, decoradores, e mesmo de escritores, para visualizar a sua música. Usei os instrumentos do meu tempo: o vídeo, o laser, etc...
E a opção pelos grandes espaços, como surgiu?
Sempre pensei que a minha música não era coisa de caves, como o rock, mas sim do espaço público. Procurei lugares... Depois pensámos na dimensão dos espaços. Ao ar livre, podemos ter mais gente que numa sala. E as coisas foram-se transformando. Além disso sempre vivi obcecado pelo one off, pelas coisas que não se repetem. Isto deve vir dos meus dias de infância, em Lyon. Morava numa praça e lembro-me dos dias em que o circo chegava. Faziam o espectáculo e iam embora no dia seguinte. Quem via, via, quem perdia, não via. Não havia segunda vez. Quis, então, fazer coisas que não se repetissem. Sobretudo numa época em que tudo pode ser arquivado. Hoje podemos guardar os programas de televisão num disco duro e ver mais tarde... Mas ver o filme de noite ou na manhã seguinte não é a mesma coisa. Temos de escolher o momento e viver em função dessa opção. As pessoas sabem que o concerto acontece naquele dia, e não depois. São emoções efémeras, mas que podemos partilhar uns ao lado dos outros. Por todas estas razões os concertos ganharam esta expressão. E também porque, ano após ano, me foram oferecendo a possibilidade de actuar em locais irrecusáveis.
Como por exemplo?
Houston... À partida não me interessava... Não tinha relação alguma com o Texas. Mas a NASA entrou em cena... Fui ver o local, gostei da arquitectura...
Mas foi um concerto com uma face de tragédia, dada a explosão do shuttle, que impediu que um astronauta entrasse em directo do espaço...
De facto. A NASA, pela primeira vez, envolve-se numa acção como aquela. Reflectimos sobre o que se poderia fazer e dizem-me que um dos astronautas era saxofonista. Escrevi uma peça para ele, esperando que dela gostasse. Gostou muito, ensaiou muito... Ensaiámos juntos... Depois a nave explode na largada e fiquei devastado, como toda a gente ficou. Mas telefonaram-me a dizer que não devia deixar de fazer o concerto. Pelos astronautas... E foi o que se conhece... As pessoas saíram à rua, a estrada ficou bloqueada. Um milhão de pessoas, nunca tinha acontecido.
Não foi o seu único concerto épico...
Em Moscovo esperava 30 mil pessoas e apareceram três milhões! Oxygene e Equinoxe foram, na altura, músicas ligadas a uma mensagem de evasão. São acontecimentos que catalizam uma energia, mas dos quais não sou o único responsável.
Já ouve contactos para o trazer a Portugal?
Já, sim, por três vezes. Na Praça do Comércio, na zona da Expo e no Porto...Por várias razões nunca se concretizou. Mas terei de tocar um dia em Lisboa. A luz dá-me a impressão de estar em Lyon... Quando editei o Oxygene, as primeiras cartas que me chegaram do estrangeiro vieram de Portugal. É natural, até porque há muitos portugueses em França. Os concertos que começarei a dar 12 de Dezembro [em Paris] são de escala diferente. Vou apresentar estes instrumentos e tocar na proximidade das pessoas. Receio que se trouxer este concerto mais pequeno a Portugal, antes de um outro, ao ar livre, possa enganar as pessoas.