Apesar das raras (muito raras) manifestações de real e entusiasmante personalidade “roquenrole” de bandas portuguesas na língua oficial da coisa (leia-se o inglês), a multidão de novas bandas que vão surgindo, garagem após garagem, umas claramente com carros lá dentro e pouco espaço para ensaiar, insiste e insiste. Resultado: nada! Claro! Salvo pontuais casos, e mesmo esses não alheios ao eventual pontapé na gramática, mas com ar de “eu até leio livros em inglês”, o pop/rock lusitano enferma de inglesite atrofiante, reduzindo a esmagadora maioria das bandas e artistas a solo a pouco mais que a soma, amalgamada, das suas referências. Clones compósitos, por vezes com boas melodias, ocasionalmente grandes canções, uma ou outra vez com um disco digno de caber na nossa playlist. Mas salvo em casos de real labuta fora de portas, porque o sonho de ser escutado do lado de lá da fronteira não cai do céu, lá vemos a esmagadora maioria das bandas pop/rock portuguesas a mostrar que são uma espécie de upgrade do conceito de banda de covers. Ou seja, fazem o som, mas em vez de versões aplicam ali uns inéditos. Há excepções, sublinhe-se de novo, mas poucas. Muito poucas (e todas elas devidamente reconhecidas).
O aparecimento, cada vez mais evidente, de uma nova geração de bandas a cantar em português devolve ao presente a pulsão que no passado fez a diferença dos yé yés nos dias do Quarteto 1111 e Filarmónica Fraude ou que deu real visibilidade ao fenómeno pop/rock na primeira metade de 80. O desafio de encontrar uma expressão, em português, para modelos musicais que nos chegam com bilhete de identidade já conhecido é, chave segura para ensaiar personalidade (sem garantias, naturalmente). Para que cada um, por aqui, nas palavras que conhece, em que fala, lê e sonha, se encontre na música onde se quer também descobrir.
Não é por passadismo ou nostalgia dos “booms” passados que aqui se sublinha a opção pelo português na hora de cantar. Uma compilação, recentemente editada pela Chiado Records, assim como o Acorda (de Henrique Amaro) dá conta da extrema vivacidade e liberdade que brotam do Portugal musical actual. Porém, poucos daqueles nomes sobreviverão ao “é giro”... Poucas demonstrarão capacidade para sustentar uma carreira e mostrar que são mais que a tal amálgama de referências... Depois dos 2008 (de quem se espera disco... em 2008), a mais estimulante revelação do rock made in Portugal chega de Queluz, e canta em português. Chamam-se Pontos Negros e apresentam um EP de estreia no qual, apesar das ainda evidentes manifestações de admiração pelas “suas” bandas (o gosto pelos Strokes mora por ali), já revela a vontade de marcar um espaço, comunicar, desafiar a comunhão. O seu nome é uma espécie de jogo de contrários com ponto de partida nos White Stripes. Mas em vez de procurarem a aplicação directa dos templates admirados, mostram vontade de contar as suas histórias, as verdadeiras e as de eventuais personagens de ficção. Para já soam a trabalho em curso... Têm uma etapa de maturação e conquistas pela frente, que determinará os “sims” e as sopas... Mas mostram já um bom ponto de partida. Estejamos atentos a estes Pontos Negros.
Link para o MySpace da banda, onde se pode fazer o download gratuito do EP.