quarta-feira, outubro 03, 2007

Depois da utopia

"The times they got too clear
So you removed all the mirrors
Once the family felt secure
Now no one's very sure"

São versos de Your Own Worst Enemy, um dos doze temas de Magic, o novo álbum de Bruce Springsteen. Por um lado, é o reencontro com a E Street Band, colectivo essencial em grande parte do trajecto criativo de Springsteen — desde os tempos heróicos de Greetings from Asbury Park, N. J. (1973) e The Wild, the Innocent and the E Street Shuffle (1973) —, e com quem ele já não gravava desde The Rising (2002), o seu belíssimo tributo pós-11 de Setembro; por outro lado, depois do retorno à folk, com Devils & Dust (2006) e We Shall Overcome: The Seeger Sessions (2006), Magic proclama a repetida urgência de um rock'n'roll puro e duro, mesmo se sensível às derivações inspiradas em Phil Spector e na sua "Wall of Sound" (sublinhe-se a renovada importância dos intrumentos de corda), particularmente sensíveis num dos clássicos de Springsteen, Born to Run (1975). Tudo isto num clima de evocação e, mais do que isso, invocação de uma América perdida nas suas feridas contemporâneas e na dolorosa contemplação das suas raízes utópicas. Simples e directo, e ao mesmo tempo íntimo e misterioso, Magic é um grande acontecimento, simultaneamente musical e político — dizê-lo em relação ao autor de Born in USA é, em todo o caso, uma redundância.