sábado, outubro 27, 2007

2057: Odisseia Solar

Há muito que não se via uma produção de ficção científica deste calibre. Sunshine – Missão Solar, de Danny Boyle junta o state of the art da tecnologia de efeitos visuais do momento para ilustrar uma história que colhe referências no 2001 de Kubrick e no Solaris (mais no de Soderbergh que no de Tarkovski), junta ao cocktail algum “psicologês” e relata a missão que tenta uma última hipótese de salvamento da vida na Terra, esperando conseguir reacender um Sol moribundo. O DVD inclui bons comentários e making of. Danny Boyle resolveu juntar duas curtas-metragens de outros realizadores para aproveitar as potencialidades de divulgação do DVD. Pena, aí, que tenha escolhido curtas absolutamente inconsequentes...

Estamos num futuro não muito distante, mais concretamente no ano 2057. Mas nada na Terra se assemelha ao que hoje conhecemos. Um longo Inverno há muito que atormenta o planeta. Um Inverno que se deve ao súbito e inesperado arrefecimento do Sol que, moribundo, ameaça a sobrevivência da humanidade. Há sete anos, uma missão de "salvamento" partiu rumo à estrela que nos deu vida. A bordo levava explosivos nucleares num porão do tamanho de uma cidade. Objectivo: reacender o Sol... Todavia, na recta final da missão perdeu-se o contacto com a nave. A "carga" não foi entregue. E o Sol continuou a arrefecer...
Este é o ponto de partida para este filme, que representa a mais ambiciosa e exuberante das produções de ficção científica dos últimos anos. Sunshine coloca-nos a bordo da Icarus II, segunda e derradeira missão de salvamento, levando a bordo todo o material nuclear resgatado pelo planeta fora. Entre a simplicidade militar de um submarino nuclear nas áreas de trabalho e carga, e o requinte de design minimalista dos compartimentos habitados, a nave acolhe uma tripulação escolhida a dedo. As pequenas tensões do dia-a-dia são controladas por um psicólogo que, em vez de comprimidos, receita minutos de paz numa sala que recria holograficamente situações relaxantes.
Perto da órbita de Mercúrio, porém, o que até então era uma missão controlada ao pormenor e cem por cento fiel ao programa estipulado, sofre reviravolta súbita no momento em que se descobre, inerte no espaço, a desaparecida Icarus I. Coloca-se a questão: manter a missão ou resgatar a carga explosiva da nave lançada sete anos antes, aumentando a hipótese de sucesso de detonação nuclear no Sol? O desvio de rota, decidido segundo o oposto do velho provérbio "mais vale um pássaro na mão que dois a voar", abre contudo uma sucessão de acidentes inesperados que, hora após hora, cada vez mais comprometem o sucesso da missão e, consequentemente, a última hipótese de futuro para a humanidade.
Um subtexto de fanatismo religioso atravessará uma história que, essencialmente contemplativa nos primeiros largos minutos do filme, caminha depois para um ritmo acelerado de acção, com episódio de arritmia à la thriller na recta final. No fim, tal como um astronauta deixa em mensagem à família, se o Sol se acender, foram bem sucedidos...
PS. Versão editada de textos publicados no DN e na revista NS