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Não posso dizer que tenha uma visão neutra do assunto, quanto mais não seja porque sou um desses colaboradores. O facto entristece-me, mas também não quero favorecer qualquer complexo decorrente da nossa condição (portuguesa) no panorama internacional das publicações de cinema — afinal de contas, a Premiere dos EUA também encerrou, passando a funcionar apenas online. Vejo antes o facto como um sintoma (mais um...) do alheamento de quem toma decisões — mais exactamente: de quem detém o poder económico — em relação a um fenómeno, não exactamente bizarro nem impopular, que dá pelo nome de cinema.
Basta ver, aliás, como à nossa volta (a começar pelas televisões) triunfa uma mentalidade de menosprezo pela especificidade cinematográfica. E não falo apenas das muitas maravilhas que os filmes nos oferecem e ensinam. Falo de coisas mais básicas: o cinema existe, tem um público (aliás, tem muitos públicos — no plural), mas quem decide tende quase sempre a pensar que o entertainment está onde a televisão o pôs.
O mais absurdo neste fim mais que prematuro da Premiere portuguesa é que, sob a direcção de José Vieira Mendes e com a sua microscópica mas talentosa equipa redactorial, a revista tinha, de facto, cumprido aquilo que qualquer gestor mais ambiciona: definir um perfil estável do produto, tornando-o financeiramente consistente e mantendo-o através de um público de rara fidelidade.
E será uma ilusão infantil (e económica) supor que a "pequenez" dos números da Premiere decorre de uma qualquer fragilidade. Na verdade, cada vez mais, o mercado é um fenómeno global de nichos e esperar que tudo se possa medir segundo uma lógica televisiva de audiências é ingenuidade e, mais do que isso, um crasso erro económico. Com esta notícia, a cinefilia perde — e também a economia do cinema.