Domingo, 9 de Setembro de 2007 (cer-ca das 22h15) — No Jornal 2, da RTP2, apresentado por Ana Ribeiro, o caso McCann suscita uma entrevista com Rui Abrunhosa Gonçalves, do Centro de Investigação em Psicologia da Universidade do Minho. Para terminar o diálogo, a jornalista pergunta qual a reacção de um pai a quem desaparece um filho. O entrevistado responde apenas com uma palavra: "Deprime." Perante a contundência da resposta, há uma insistência, tentando saber se os rostos do casal McCann reflectem ou não essa depressão. Rui Abrunhosa Gonçalves lembra: "Isso não se consegue ver no rosto."
Foi um grande e perturbante momento de televisão. Em primeiro lugar, porque Rui Abrunhosa Gonçalves resistiu a ser empurrado para o papel que, em muitos casos, leva as televisões a convocar os chamados "especialistas" — o que lhes é implicitamente pedido é que, em última análise, confirmem um discurso impressionista que as próprias televisões já antecipadamente produziram. Depois, porque a pergunta de Ana Ribeiro revela, de forma linear e cristalina, a filosofia dominante da informação televisiva, ou seja: o real é algo que se deixa ler nas imagens (televisivas), até porque, no caso das pessoas humanas, cada um é "aquilo" que tem no rosto — para dizer as coisas de forma muito clara e inequívoca: não há diferença entre este espontaneísmo com que se anula a complexidade do mundo e a ideologia normativa de um qualquer Big Brother.
Não estou a dizer que o Jornal 2 é o Big Brother. Por maioria de razões se compreenderá que estas linhas não envolvem qualquer dúvida sobre a seriedade e a dedicação profissional de quem apresentava o citado serviço informativo. Acontece apenas que uma ideologia pode ser isso mesmo: um conjunto de valores (neste caso, numa área específica do jornalismo) que actuam por uma espécie de automatismo anónimo, para além da vontade de quem, muitas vezes inadvertidamente, pode ser porta-voz do seu simplismo.