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Não admira que Osvaldo Golijov seja, hoje, um dos nomes mais acarinhados do catálogo da Deutsche Grammophon. A sua primeira edição para este catálogo, o espantoso ciclo de canções
Ayre (2005), para a voz de Dawn Upshaw, deu-lhe visibilidade como nunca antes havia conhecido. No ano passado, a ópera
Ainadamar valeu-lhe dois Grammys e maior número de admiradores. Em poucos anos, cruzando na sua música ecos da tradição clássica ocidental, linhas sugestivas de algumas correntes contemporâneas, temperos de
world music e usando ferramentas electrónicas habitualmente mais empregues nos espaços da música de dança actual, Osvaldo Golijov mereceu ser designado como o primeiro compositor do século XXI. A sua visão musical resulta da soma de pedaços colhidos em vários tempos e lugares. As suas composições são frutos de uma atitude que vê no ser híbrido uma forma de representar um presente onde o particular se entende com o global. Filho de pais do Leste europeu, mas crescido e educado na Argentina, Golijov descreve a sua vida como uma de constantes migrações. E na sua música regista essa mesma autobiografia errante.
Oceana é o seu terceiro disco para a Deustshe Grammophon. E, talvez, o mais “clássico” da sua obra até aqui. O título do álbum é também o da peça de abertura, inspirada numa cantata de Bach e criada sobre um poema de Neruda. Nascida de um desafio lançado para um ciclo de cantatas para um festival centrado em Bach na Universidade do Oregon, Oceana surgiu com a vontade de “transformar paixão em geometria”, como Golijov explica no
booklet. Transformar água e saudade, luz e esperança, “toda a narureza sul americana” em música. O poema é tirado de
Cantos Cerimonialres, de Neruda (1931), as suas palavras aqui entregues à voz da brasileira Luciana Souza (que em 2008 reencontraremos na nova gravação de
St Mark’s Passion, de Golijov, a editar pela DG). Neste disco, além desta peça que revela evidências sul-americanas entre uma música essencialmente ondulante, tranquila como um mar em dia de calmaria, encontramos duas outras magníficas obras de Golijov (e nelas, curiosamente, o melhor desta edição). Numa delas o reencontro do compositor com o Kronos Quartet dá-nos o espantoso, sombrio, quase arrepiante,
Tenebrae. A fechar, novamente com Dawn Upshaw,
Three Songs, onde ecos do Leste europeu irrompem entre melodias tão seguras, mas levres, como uma convicta rabanada de vento.