Texto publicado no Diário de Notícias (revista "NS", 7 de Junho), com o título 'Mitologia e nostalgia' >>> Ao longo de anos recentes, o “filme-por-episódios” reconquistou espaço nos mercados cinematográficos. Trata-se de um conceito muito ligado à década de 60 que serviu para afirmar os nomes dos autores que, na época, podiam personificar as mais diversas vontades de diversificação temática e evolução estética. Caso emblemático que ficou para a história é Paris Visto Por..., uma produção de 1965 em que vários cineastas da Nova Vaga francesa (incluindo Jean-Luc Godard, Eric Rohmer e Claude Chabrol) se propunham retratar a Cidade Luz a partir de pequenas ficções mais ou menos fundadas em episódios banais do quotidiano.
O projecto de Paris, Je T’Aime não anda muito longe dessa experiência, mesmo se agora o número total de histórias cresceu para dezoito. Aliás, a diferença fundamental não estará tanto na quantidade de sketches, mas sim na diversidade geográfica e cultural de quem os assina. Por um lado, como é óbvio, surgem vários nomes do cinema francês, incluindo Olivier Assayas, Gérard Depardieu (a realizar e interpretar) e Bruno Podalydès; por outro lado, o leque de países de origem dos autores inclui, entre outros, os EUA (Joel & Ethan Coen, Gus Van Sant, Richard LaGravanese), Japão (Nobujiro Suwa — com Juliette Binoche, na foto), Alemanha (Tom Tykwer), Austrália (Christopher Doyle) e Brasil (Walter Salles).
Há episódios num registo irónico, quase burlesco, como o dos irmãos Coen, com Steve Buscemi a protagonizar uma pequena aventura mais ou menos rocambolesca. Outros, como o de Nobuhiro Suwa, fazem apelo a um lirismo próximo do fantástico. Outros ainda convocam o romantismo de Paris, como acontece na proposta insólita de Gus Van Sant (em que participa, como actriz, Marianne Faithfull). Todos partem de uma espécie de nostalgia desencantada das memórias mitológicas de Paris, ao mesmo tempo que coleccionam pequenas fatias da vida dos nossos dias.
O resultado, mesmo desequilibrado, acaba por traduzir algo de essencial: estamos perante uma antologia de contrastes que reflectem, de uma só vez, as diferenças dos olhares dos respectivos cineastas e as formas plurais da produção contemporânea. Isso mesmo se pode confirmar através dos extras (reunidos num segundo disco). De facto, os breves “making of” dos dezoito episódios como que definem uma antologia de estilos e olhares à procura de uma expressão cúmplice.
Não estamos, como é óbvio, perante a mesma lógica criativa dos tempos da Nova Vaga. Das técnicas às opções criativas, as mudanças são imensas. Em todo o caso, prevalece um sentimento muito forte: o de que o cinema se pode subtrair aos modelos mais vulgares de narrativa (que, nos nossos dias, são quase sempre de raiz televisiva) para propor novas visões daquilo que, afinal, está para além das rotinas aparentemente indiferentes de uma grande metrópole.
O projecto de Paris, Je T’Aime não anda muito longe dessa experiência, mesmo se agora o número total de histórias cresceu para dezoito. Aliás, a diferença fundamental não estará tanto na quantidade de sketches, mas sim na diversidade geográfica e cultural de quem os assina. Por um lado, como é óbvio, surgem vários nomes do cinema francês, incluindo Olivier Assayas, Gérard Depardieu (a realizar e interpretar) e Bruno Podalydès; por outro lado, o leque de países de origem dos autores inclui, entre outros, os EUA (Joel & Ethan Coen, Gus Van Sant, Richard LaGravanese), Japão (Nobujiro Suwa — com Juliette Binoche, na foto), Alemanha (Tom Tykwer), Austrália (Christopher Doyle) e Brasil (Walter Salles).
Há episódios num registo irónico, quase burlesco, como o dos irmãos Coen, com Steve Buscemi a protagonizar uma pequena aventura mais ou menos rocambolesca. Outros, como o de Nobuhiro Suwa, fazem apelo a um lirismo próximo do fantástico. Outros ainda convocam o romantismo de Paris, como acontece na proposta insólita de Gus Van Sant (em que participa, como actriz, Marianne Faithfull). Todos partem de uma espécie de nostalgia desencantada das memórias mitológicas de Paris, ao mesmo tempo que coleccionam pequenas fatias da vida dos nossos dias.
O resultado, mesmo desequilibrado, acaba por traduzir algo de essencial: estamos perante uma antologia de contrastes que reflectem, de uma só vez, as diferenças dos olhares dos respectivos cineastas e as formas plurais da produção contemporânea. Isso mesmo se pode confirmar através dos extras (reunidos num segundo disco). De facto, os breves “making of” dos dezoito episódios como que definem uma antologia de estilos e olhares à procura de uma expressão cúmplice.
Não estamos, como é óbvio, perante a mesma lógica criativa dos tempos da Nova Vaga. Das técnicas às opções criativas, as mudanças são imensas. Em todo o caso, prevalece um sentimento muito forte: o de que o cinema se pode subtrair aos modelos mais vulgares de narrativa (que, nos nossos dias, são quase sempre de raiz televisiva) para propor novas visões daquilo que, afinal, está para além das rotinas aparentemente indiferentes de uma grande metrópole.