Vale sempre a pena visitar a página de cinema do canal franco-alemão Arte. Esta semana encontramos em destaque o filme As Vidas dos Outros, de Florian Henckel Von Don-nersmarck, brilhante estudo psicológico sobre as formas de vigilância e repressão da Stasi, a polícia política da RDA. Há uma razão de calendário para tal destaque: o filme foi lançado quarta-feira em França (a estreia portuguesa está marcada para a próxima quinta) e, além do mais, é o candidato alemão ao Oscar de melhor filme estrangeiro. Mas há, sobretudo, uma razão estrutural, decorrente dos valores que este canal tão exemplarmente tem simbolizado: As Vidas dos Outros é uma produção com a participação do próprio Arte.
Que os mais precipitados não deduzam o que estas linhas não dizem. Não se trata de proclamar que o modelo do Arte deveria ser seguido por qualquer canal português. A simples consideração das diferenças de contexto (a começar pelas diferenças económicas) aconselha a que não cedamos à demagogia de pensar que os fenómenos televisivos se podem "deslocar" automaticamente. Nem sequer se afirma que os canais portugueses, a começar pela RTP, não têm investido no cinema português.
O que importa reter é que o cinema não é um corpo estranho na dinâmica do Arte, desde a produção à promoção, passando obviamente pela programação. Ao destacar As Vidas do Outros (na mesma semana em que Diamante de Sangue, com Leonardo DiCaprio, chega aos ecrãs franceses), o Arte vem explicitar uma orientação em que o cinema persiste como um vector forte da área da ficção, já que não foi anulado por patéticas deri-vações "telenovelescas" nem, muito menos, por qualquer cedência aos desígnios da mais estúpida reality TV.
Infelizmente, entre nós persiste o ponto de vista dominante segundo o qual a visibilidade do cinema (do seu presente e também das suas memórias) é uma questão "intelectual" que apenas mobiliza algumas pobres mentes da área da crítica. De facto, pela milionésima vez, e com militante serenidade, importa repetir que os valores de um canal de televisão se definem, em grande parte, pelas suas opções na área da ficção. Entre nós, escusado será dizer que, nessa área, a RTP poderia desempenhar um fundamental papel de referência. Poderia e deveria, acrescento eu.
Que os mais precipitados não deduzam o que estas linhas não dizem. Não se trata de proclamar que o modelo do Arte deveria ser seguido por qualquer canal português. A simples consideração das diferenças de contexto (a começar pelas diferenças económicas) aconselha a que não cedamos à demagogia de pensar que os fenómenos televisivos se podem "deslocar" automaticamente. Nem sequer se afirma que os canais portugueses, a começar pela RTP, não têm investido no cinema português.
O que importa reter é que o cinema não é um corpo estranho na dinâmica do Arte, desde a produção à promoção, passando obviamente pela programação. Ao destacar As Vidas do Outros (na mesma semana em que Diamante de Sangue, com Leonardo DiCaprio, chega aos ecrãs franceses), o Arte vem explicitar uma orientação em que o cinema persiste como um vector forte da área da ficção, já que não foi anulado por patéticas deri-vações "telenovelescas" nem, muito menos, por qualquer cedência aos desígnios da mais estúpida reality TV.
Infelizmente, entre nós persiste o ponto de vista dominante segundo o qual a visibilidade do cinema (do seu presente e também das suas memórias) é uma questão "intelectual" que apenas mobiliza algumas pobres mentes da área da crítica. De facto, pela milionésima vez, e com militante serenidade, importa repetir que os valores de um canal de televisão se definem, em grande parte, pelas suas opções na área da ficção. Entre nós, escusado será dizer que, nessa área, a RTP poderia desempenhar um fundamental papel de referência. Poderia e deveria, acrescento eu.
* Texto publicado no Diário de Notícias (4 Fev.), com o título 'Cinema à francesa'.