O ponto de partida é simples, mas a história evolui progressivamente mais bizarra e complexa. Um homem resolve cortar um dia o seu bigode, que usa desde há muitos anos. Mas estranha que a mulher não comente o novo visual. Nem a mulher, nem os amigos ou colegas de trabalho, que lhe juram todos eles a pés juntos que nunca usou bigode na vida, encarando-o como se algo errado estivesse a acontecer. Marc (Vincent Lindon) sente-se terrivelmente só, perdido, e suspeita até da mulher (Emmanuelle Devos)… Estará a ficar louco, ou a cair numa eventual teia conspirativa montada, pelos que o rodeiam, contra si? Estará são, entre quem o quer afastar de algo (casamento, trabalho…)? Paranóico, temendo tudo e todos, sentindo-se permanentemente sob ameaça de que não conhece a real expressão? Ou simplesmente demente, delirante, somando verdade e ficção numa mesma linha de tempo, ambas as realidades diluindo-se e confundindo-se numa mesma vida? Baseado no romance La Moustache de Emmanuel Carrère (que entre nós aprenas tem traduzidos os belíssimos Pesadelo Na Neve e O Adversário), e realizado pelo próprio romancista (naquela que é a sua segunda experiência no cinema depois da estreia em 2003 com Retour À Kotelnitch), Amor Suspeito demorou a chegar, mas finalmente está nas salas. Uma realização competente, que serve sobretudo o contar da história e o nosso progressivo mergulho na espiral de dúvidas que nos sugere. Personagens, escassos, mas bem definidos e, afinal, pilares de toda a acção. E o sublime Concerto Para Violino e Orquestra de Philip Glass a sublinhar a loucura e obsessões, ou simplesmente, a dúvida, de Marc a alastrar.
Equívoco 1: o título. Amor suspeito?... O filme tem por título original La Moustache. Que tal, O Bigode? Era difícil?...
Equívoco 2: Como foi possível ver o filme estrear sem que nenhum editor livreiro se tenha lembrado de traduzir e lançar entre nós o romance no qual se baseia? E, já agora, traduzir o magnífico livro sobre Philip K. Dick que Emmamnuel Carrère editou há poucos anos?