Lindstrom “It’s a Feedelity Affair”
De tantos a tantos anos o disco sound conhece novos adeptos com vontade de arregaçar as mangas e o reinventar. Mas é igualmente frequente a forma como muitas destas tentativas de reinvenção rapidamente resvalam para o kitsch e o derivativo, a memória de 90 podendo recordar neste capítulo promessas como M People, Joey Negro ou Ultra Naté que, depois de primeiros sinais cativantes, acabaram na vala comum da inconsequência. Tal não parece ser o destino do norueguês Hans Peter Lindstrom que, por si só, cada vez mais se assume como o mais sólido porta-estandarte do nu-disco. Depois de mostrar espantosa capacidade em caminhar por terrenos “perigosos” no genial I Feel Space, sem nunca resvalar para o lado errado da coisa, eis que nos dá em It’s A Feedelity Affair um dos melhores álbuns de música electrónica dos últimos tempos, um dos mais sólidos depoimentos de reinvenção das genéticas do disco sound e a mais viçosa declaração de salvação para a música de dança nos últimos meses... Estão aqui marcas de um bom gosto que não esconde nascer de pistas com etapas (de facto) duvidosas como Vangelis ou Giorgio Moroder, todavia convocando o que de melhor trouxeram à história de 70 (There’s A Drink In MY Bedroom and I Need A Hot Lady é dos mais sérios candidatos a descendente directo de I Feel Love alguma vez criados). Todavia, a mais evidente das marcas de referência nesta música parte da memória (a redescobrir) de Patrick Cowley, um dos inventores do hi-nrg, por muitos apenas conhecido pelas criações e produções que assinou para Sylvester na primeira metade de 80. Disco de sabor a ficção científica!
Beirut “Gulag Orkestar”
É uma das maiores revelações de 2006, soa descradamente a paisagens rurais algures perdidas nos Balcãs, tem nome de cidade libanesa... Mas vem de Albuquerque, no Novo México. Este é o projecto de Zach Condon, um jovem músico que encontrou primeiros estímulos na música de Stephin Merritt e dos Beach Boys, mais tarde a fé nos Neutral Milk Hotel. Tudo referências de topo! O seu álbum de estreia cruza identidades características do rock alternativo dos nossos dias com assimilações de traços da música cigana da Europa de Leste, sem esquecer uma pitada de indie folk e um saudável sentido lo-fi que garante a verdade primordial de uma visão apenas possível numa etapa em que os sonhos ainda comandam a vida. Zach revela-se um magnífico escritor de canções. E quando dispensar os por vezes excessivos (e frequentemente apenas plásticos, portanto, decorativos) gimmicks colhidos a Leste, poderá voar bem mais alto. Mesmo assim, uma das mais sólidas promessas de 2006!
Banda do Casaco “Hoje Há Conquilhas, Amanhã Não Sabemos”
Este não só é um dos mais importantes discos do Portugal musical de 70, como um caso à parte na discografia da Banda do Casaco. À parte, porque, por um lado, representa a sua obra mais próxima da ideia primordial que da eventual arte final que dela poderia ter evoluído. À parte, porque sintetiza conceitos (musicais e líricos) ensaiados nos dois primeiros álbuns e promove uma assimilação de colheitas feitas junto de heranças do Portugal (musical) profundo, com resultados mais pungentes que os que escutaríamos em discos posteriores. A sátira incisiva nas palavras de António Pinho e as visionárias opções musicais de Nuno Rodrigues conhecem aqui um momento de afirmação superior, corajoso na desmontagem de um país onde criticar a recente revolução gerava erupções de intolerância. Este é um disco nascido de uma saudável inquietação não alinhada, onde além das ideias e palavras se ensaiava uma noção de world music antes mesmo do conceito se inventado. Texturalmente fértil, cenográfico. Como poucos, um disco ácido, ousado, firme, verdadeiro. A reedição do ano (houve mais?)...
Também esta semana: Tori Amos (caixa), Joseph K (antologia), Pavement (reedição), Chumbawamba
Brevemente:
4 de Dezembro: Humanos (ao vivo CD + DVD), Sam The Kid, Heaven 17 (best of), Steve Reich (caixa), Johann Johansson, Xutos & Pontapés (DVD), Cristina Branco
Dezembro: Sonic Youth (lados B), Bernardo Sassetti, Clash (caixa de singles)
Para 2007: JP Simões, U-Clic, Klaxons, The Good The Bad and The Queen, Mika, John Cale, Amélia Muge
Estas datas provém de planos de lançamento de diversas editoras e podem ser alteradas a qualquer momento
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